12/12/2010

Virou moda ser ateu

Parece que virou moda ser ateu. Muitas pessoas estão vindo a público para manifestar seu ateísmo ou agnosticismo. Mas o que pensar desse fenômeno? Faltou coragem antes? Por que tantos não fizeram isso antes? Em todo caso há uma observação de Rubem Alves que é interessante:

Houve um tempo em que os descrentes, sem amor a deus e em religião, eram raros. Tão raros que eles mesmos se espantavam com a sua descrença e a escondiam, como se ela fosse uma peste contagiosa.


Há,em todo caso, o perigo das generalizações: achar que todos os ateus são iguais; o que seria o mesmo que achar que todos aqueles que acreditam em um deus são iguais.
Para aqueles que são novos na empreitada, uma diferença básica entre ser ateu ou agnóstico.

O ateísmo nega a existência de um deus, qualquer que seja esse deus. Ele não sente nenhum constrangimento ao afirmar que não existe deuses e que deuses não lhes fazem falta. Não alimenta qualquer tipo de sentimento na crença em um deus, nem amor, nem ódio, afinal, como amar o que não existe ou odiar o que não existe?

O agnosticismo aponta para a impossibilidade de provar a existência - ou não - de Deus. O significado da palavra "agnóstico" é "sem conhecimento". O agnosticismo aponta para a impossibilidade do (re) conhecimento de um deus. O agnosticismo não tem certeza de que existe um deus, mas também ele nunca iria afirmar que não existe um deus. Ou seja, ele não afirma nem nega a existência de um deus.

Tudo de ruim que acontece no mundo: "É falta de deus no coração!"


É mentiroso? É falta de deus no coração.
É briguento? É falta de deus no coração.
Acha-se melhor do que os outros? É falta de deus no coração.
Ficou doente? É falta de deus no coração.
Bateu o carro? É falta de deus no coração.
Roubou? É falta de deus no coração.
Ficou triste? É falta de deus no coração.
Não passou nas provas? É falta de deus no coração.
Perdeu o emprego? É falta de deus no coração.
É violento e estúpido e não respeita ninguém? É falta de deus no coração.
Foi preso? É falta de deus no coração.
É traficante? É falta de deus no coração.
É pedófilo? É falta de deus no coração.
Matou? É falta de deus no coração.
É drogado? É falta de deus no coração.
Brigou com o visinho? É falta de deus no coração.
Bateu na mulher? É falta de deus no coração.
É imoral? É falta de deus no coração.


Quando afirmam que o mal do mundo “é falta de deus no coração”, quando afirmam que alguém que cometeu algo ruim o fez porque não tinha um deus no coração, diretamente estão acusando o pensamento ateu de ser mal. Estão afirmando diretamente que o ateísmo é o mal, que os ateus estão propensos à prática do mal mais do que qualquer outra pessoa.
Desculpe ser eu informar, mas pensar assim é pensar de forma preconceituosa.


Alexsandro

05/12/2010

Complexo de salvador


Uma coisa que tenho certeza é que não carrego nenhum complexo de salvador: já imaginou o que é desejar convencer quase 8 bilhões de pessoas a respeito de qualquer assunto, mesmo que seja para tornar o mundo melhor?
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Uma cara a mais

Difícil é encarar aquela criatura com cara de genérico mas que se acha a própria musa inspiradora dos mais loucos sonhos eróticos.

A vaidade é mesmo a mãe da tolice.


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MENSAGENS DE AUTO-AJUDA

Atualizando o antigo testamento: que se faça aos outros pior do que o que nos fazem.

Concordo, a lobotomia faz milagres pela salvação alheia.

Temos de ter em mente que pregos e martelos são invenções humanas, demasiadas humanas.

Um pessimista sempre olha para os dois lados da rua, mesmo sendo uma rua de mão única.

Nem tente, você nunca vai conseguir decepcionar um pessimista.

Devemos ter claro que só há tragédia para os ricos, belos e felizes.

Tudo é perfeito até você começar uma conversa.

A nudez e a contemplação oscilam entre a proibição religiosa e os mais deliciosos pecados: a contemplação da nudez alheia é uma prática monástica.



Alexsandro

26/11/2010

A montagem do território é correlata à montagem da fronteira


De início é válido esclarecer que a noção de território aqui trabalhada tem na definição construída por Guattari a referência primeira:

“a noção de território é entendida aqui num sentido muito amplo, que ultrapassa o uso que dela fazem a etologia e a etnologia. Os seres existentes se organizam segundo territórios que o delimitam e os articulam aos outros existentes e aos fluxos cósmicos. O território pode ser relativo tanto a um espaço vivido, quando a um sistema percebido no seio de qual um sujeito se sente ‘em casa’. O território é sinônimo de apropriação, de subjetivação fechada sobre si mesma. Ele é o conjunto dos projetos e das representações nos quais vai desembocar, pragmaticamente, toda uma série de comportamentos, de investimentos, nos tempos e nos espaços sociais, culturais, estéticos, cognitivos.

A noção de território demandaria o estabelecimento de recortes. A linha do recorte estabelecerá uma fronteira que definirá um dentro e um fora. Tudo aquilo que é usado para definir o ‘dentro’, o espírito do ‘de dentro’, será usado para assegurar a permanência do ‘fora’. A fronteira estabelecida legitima a unificação política de um território. Um território definido e definidor: um território que passa a afetar e que circunscreve o estabelecimento de alteridades: afetividade territorializada estabelecendo padrões de sensações e sentimentos que devem ser vividos e experimentados; território definindo alteridades a partir das noções ‘dentro’ e ‘fora’.
Mas como nasce um território? Do e no emaranhado dos artifícios que dão forma ao seu discurso. Lembrando que o discurso que faz nascer um território é meta-histórico na medida em que faz uso de significações teleológicas que partem de um passado redentor para um futuro promissor. O território e a fronteira não possuem essência. A configuração que assumem é artificial. No movimento de territorialização, que pode ser de identificação ou de conceituação, tudo no entorno, tudo com que entra em contato será afetado.
Há os movimentos. Um território nasce dos movimentos. Movimentos de transformação. Eles são inevitáveis. Embora muito se lute para represá-los ou reprimi-los. Os movimentos de transformação se fazem pela e na destruição, na demolição, no desfazer, no diluir, no evaporar de certos mundos, de certas configurações culturais, de certas relações sociais, de certos sentidos. Sentidos que se vão, que se perdem, que deixam de ser, que somem, e no reverso, sentidos que vêm, se acham, que passam a ser, que aparecem. Um ambiente que se tornou ultrapassado para expressão de afetos. Afetos que requerem novos traçados, novos territórios. São afetos ganhando vida, assumindo a vida, dando vida. E no trajeto que segue, estratégias vão sendo requeridas, fronteiras vão sendo estabelecidas.
O estabelecimento de um território acontece tentando eliminar a alteridade. Como em um ato fágico, devorar para integrar. E para aqueles que não se territorializaram, a ação êmica, vomitar para expulsar. Questionar a fronteira é correr risco - o risco do estigma, da exclusão, de ser considerado não pertencente ao território.
Vale lembrar que tal sentimento de pertencimento não é algo inerente aos indivíduos, esta noção delineia-se a partir do processo de socialização, do processo de descoberta do ambiente cultural no qual o individuo se encontra inserido. Entretanto, não há garantias de que tal sentimento venha a ser vivido com toda fidelidade. Para que tal fidelidade venha se estabelecer todo um processo de (des)construção da imagem de si e, sobretudo, da imagem do outro, deve acontecer. Os comportamentos morais e afetivos definem e caracterizam o afeto dos sujeitos ao território. O problemático aqui é quando se começa a considerar como únicos possíveis os pontos de vista imediatos ligados a sua situação e as suas atividades próprias. Cria-se um estado de espírito no qual o sujeito pode deixa de compreender sua própria situação a partir do momento em que ele só compreende o território e a fronteira na perspectiva ‘do dentro’. Tanto elementos afetivos quantos intelectuais estão em jogo. O estabelecimento da fronteira pode significar o estabelecimento de um limite entre a percepção de si (o de dentro) e a percepção do outro (o de fora). Tal limite se encontra na percepção do outro, mais especificamente na ignorância, no desconhecimento do que o outro de fato representa e da importância do outro enquanto outro. Uma percepção auto-referencial que vai à direção de uma atitude de superioridade frente a outras sociedades e culturas a partir de uma imagem do outro, pejorativa e falsa.
A desqualificação do outro alimenta as mais diversas formas de preconceitos, racismos, fanatismos e xenofobias. O que alimenta tais atitudes é, sem dúvida, a incapacidade de compreender a complexa trama de elementos que envolvem a construção da alteridade, do seu conteúdo e do seu funcionamento. Havendo, por conseguinte, uma redução dos seus elementos componentes dentro de uma elaboração de visão de mundo extremamente centrada em um conteúdo moral. A incapacidade de compreender e de conceber a alteridade como uma invenção, como uma construção, pode levar a geração de um conteúdo moral que busca evitar qualquer esforço reflexivo, qualquer analise sobre as implicações de se viver sob um regime de fronteira. Esse conteúdo moral pode chegar às raias da crueldade, da brutalidade, do totalitarismo e do fascismo. Tal conteúdo moral quase sempre desqualifica os esforços do pensamento criterioso e analítico. Assim, a incapacidade de autocrítica, somada a condenação de qualquer tipo de crítica, fazem da fronteira um espaço de atitudes arrogantes, fundado em idéias preconcebidas, de circulação de discursos arbitrários, caprichosos e injustos.
Alexsandro

REBELDIA



Bob Cuspe
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A rebeldia esteve presente desde o inicio da civilização e estará até seu fim.


Polar

25/11/2010

SOBRE A MEDIOCRIDADE E A REVOLTA

Um dos nossos problemas, assim me parece — é a questão da mediocridade. Não estou empregando esta palavra em sentido condenatório, mas é fato óbvio que a grande maioria de nós é medíocre. Poderá alguma técnica, religiosa ou mecânica, libertar-nos dessa mediocridade? Ou não deve, antes, haver uma revolta contra toda técnica?...
Nossa mentalidade é o resultado das influências; ela está condicionada por influências. E condicionados que estamos e sujeitos a influências várias, dizemos: “Escolherei uma determinada influência, um guru, escolherei o que é bom, o que é nobre; e cultivarei por meio de vários exercícios, de vários métodos, tal excelência”. Todavia, não obstante isso, nossa mente continua a ser uma mente influenciada, controlada, moldada, mente que luta para alcançar um fim predeterminado; e essa mente jamais pode achar-se em revolta, pode? Pois, no mesmo instante em que se revolta, essa mente se vê num estado de caos. A mente medíocre, pois, nunca pode estar revoltada, sendo capaz unicamente de passar de um estado condicionado para outro, de uma influência para outra.
Não deveria a mente estar sempre revoltada, para compreender as influências que a assaltam incessantemente, interferindo, controlando, moldando? Um dos fatores da mente medíocre não é o medo constante que a domina e, também, o estado de confusão em que se acha, em virtude do qual ela deseja ordem, consistência, deseja uma fórmula, um modelo pelo qual possa ser guiada, controlada; e, entretanto essas fórmulas, essas várias influências geram contradições no individuo, geram confusão no indivíduo. Estás condicionado como hinduísta ou como muçulmano; outro está condicionado pela idéia de “ser nobre” ou por idéias econômicas ou religiosas. Qualquer escolha entre diferentes influências denota sempre um estado de mediocridade. A mente que escolhe entre duas influências e começa a viver em conformidade com a influência preferida, continua a ser medíocre, não é verdade? Pois essa mente nunca se acha num estado de revolta, e a revolta é essencial para que se possa descobrir algo.



Jiddu Krishnamurti









20/11/2010

Casal Alfa

Macho Alfa

O macho alfa é líder de grupo. Não deixa sua autoridade ser comparada, nem questionada. Sua auto-estima não precisa mais da aprovação de outros para se manter. A sua autoconfiança é sua autoconfiança, faz o possível para mantê-la - nem sempre consegue, mas o que já conseguiu não perde. Não é emocionalmente dependente, faz o possível para não ser isso, pois é o sinal de chateação, pieguices e fraqueza. Não olha o mundo com ingenuidade. Estabelece seu próprio ritmo de vida, deliberando sobre cada ação. A melhor companhia para um macho alfa é uma fêmea alfa, é a única que se encontra a sua altura.


Fêmea Alfa

Fêmea Alfa é líder de grupo. A fêmea alfa não considera a clássica tríade de qualidades - beleza, amabilidade, prontidão em servir – ao contrário ela não se constrange ao quebrar esse ou qualquer outro estereótipo, faz de tudo para não se ligar a outras mulheres subservientes. Sem medo, choca, prova ser capaz, e quanto menos ajuda masculina, melhor. É inteligente, doma a vida, se cuida. Não admite fraqueza, dispensa quem não consegue acompanhá-la. Não cede, intimida pelo olhar. Tem gostos difíceis, não cede fácil. A melhor companhia para uma fêmea alfa é um macho alfa, é o único que se encontra a sua altura.


Casal Alfa

Os Alfas andam em dupla: macho e fêmea. O casal alfa tem maior liberdade social - fazem e não estão nem ai para o que pensam deles. O casal alfa faz o que quer - bancam satisfazer suas vontades, assumem suas escolhas, pagam todos os preços. Tem maior controle sobre os recursos, ou seja, se viram, dão um jeito, sobrevivem, se mantém. Conseguem se adaptar ao ambiente e transformá-lo a seu favor. Os alfas se sustentam. O casal alfa não é submisso a nenhum outro membro do grupo. O relacionamento tem grandes chances de dar certo se cada um se mantiver em seus papéis: um de macho e a outra de fêmea.



Alexsandro

A consciência da infelicidade

Elementos e atos, tudo concorre para ferir-te. Armar-se de desdéns, isolar-se em uma fortaleza de nojo, sonhar com indiferenças sobre-humanas? Os ecos do tempo te perseguiriam em tuas últimas ausências... Quando nada pode impedir-te de sangrar, as próprias idéias tingem-se de vermelho ou invadem-se umas às outras como tumores. Não há nas farmácias nada específico contra a existência; só pequenos remédios para os fanfarrões. Mas onde está o antídoto do desespero claro, infinitamente articulado, orgulhoso e seguro? Todos os seres são desgraçados; mas, quantos o sabem? A consciência da infelicidade é uma doença grave demais para figurar em uma aritmética das agonias ou nos registros do Incurável. Ela rebaixa o prestígio do inferno e converte os matadouros do tempo em paraísos. Que pecado cometeste para nascer, que crime para existir? Tua dor, como teu destino, não tem motivo. Sofrer verdadeiramente é aceitar a invasão dos males sem a desculpa da causalidade, como um favor da natureza demente, como um milagre negativo...
Na frase do Tempo os homens se inserem como vírgulas, enquanto que, para detê-la, tu te imobilizaste como um ponto.


Emile Cioran

19/11/2010

O que motiva a escolha de uma prática religiosa?

O que levaria, por exemplo, alguém escolher uma prática religiosa como o pentecostalismo? Muitos estudiosos responderam a tal questão tendo em mente que a busca por tais grupos acontecia, sobretudo, por motivos que traziam em suas variáveis a ênfase na formação de redes sociais, onde a troca de bens e serviços fluía entre os membros da congregação. A afiliação a uma igreja possibilitaria as pessoas criarem laços de relações, contatos intergrupais (e até extragrupais) na medida em que existiriam elos que as ligariam conjuntamente. Desta forma os mais predispostos para conversão seriam justamente aqueles para quem a religião possibilitasse não apenas as recompensas extre-terrenas, mas, principalmente, uma sobrevivência social.

Não que discorde totalmente desta forma de perceber o fenômeno religioso nesses tempos que caracterizam o inicio do século XXI. Digo apenas que não é mais suficiente pensar os fenômenos religiosos que atualmente presenciamos com a mesma fundamentação, uma vez que o eclodir de um número cada vez maior de igrejas não representa uma tentativa de volta a coletividade, mas, isso sim, uma acentuação do individualismo. Não representa uma reação contrária aos efeitos da modernidade sobre a sociedade, mas a acentuação de certos fenômenos característico da própria modernidade, motivados sobretudo pelas não realizações das promessas desta mesma modernidade. Não é também uma procura mística, é algo racional. É correto entender que pode haver em certas pessoas a necessidade de experimentarem alguma forma de relação mística com um sobrenatural, mas o que assistimos nessa proliferação de igrejas é outra coisa, diz respeito a uma experiência que tem como base os ímpetos e desejos individuais e consumistas, não a busca de um coletivo de relações geridas por um sistema religioso.


Alexsandro

18/11/2010

Uma nota religiosa

Não devemos nos esquecer que as religiões, os ritos religiosos, os movimentos religiosos, os religiosos, as Igrejas e tudo mais, nunca foram ou são manifestações puras e plenas de um deus. Toda experiência religiosa se passa na imanência da idolatria - a adoração a ídolos, valores, idéias, imagens, concretas ou simbólicas, são expressões dessa experiência.
Na nossa condição de homens e mulheres, vivendo numa realidade material, só podemos experimentar a vivência do sagrado por meio de alguma coisa que seja derivada de uma criação humana, seja esta um objeto ou uma lei moral. O que acontece é que podemos confundir “este algo”, na qual se firma a experiência religiosa, com o próprio “mistério transcendente”. Mas este algo é sempre algo culturalmente estabelecido e que ganha seus significado a partir daquilo que é determinado pelas circunstâncias do momento, da época.
Falamos numa experiência do sagrado por meio de práticas religiosas como sendo a possibilidade de vivência de um mistério que transcende o imanente da experiência humana. Mas isso não acontece como fato, acontece apenas como vontade, como desejo nosso que assim seja. Neste sentido é comum que os agentes religiosos acreditem que os sistemas religiosos funcionem autonomamente, não aceitando com facilidade que no emaranhado da sociedade existam uma serie de funções para esses mesmos sistemas religiosos que dizem respeito não a algo transcendente, mas a reprodução de algo social, que não diz respeito a um mistério, mas que é algo que deriva desta mesma sociedade. A religião (qualquer que seja) é, antes de qualquer coisa, uma tentativa humana de viver o movimento da história acreditando na existência de um mistério que está além, que transcende o profano, mas à frente desta crença se encontra nossa realidade humana e suas instituições.
Alexsandro

16/11/2010

A fronteira e o fluxo de alteridades


A fronteira demarca uma territorialização. O que significa territorialização? Significa a criação de um território como produto de um processo de subjetivação, fruto de “dobras”, dos agenciamentos dos fluxos, dos movimentos de imagem, de som, de palavras, de matérias, de sentimentos que caíram nas malhas de um poder. Neste sentido, a noção de fronteira é um agenciamento, um dispositivo de poder.

Mas faz-se necessário compreender que a fronteira não é uma categoria fixa, pelo qual um território se constituiria, mas algo em movimento. Entre o dentro e o fora, por ela circulam potências e sentidos. Se em um momento ela se apresenta como uma área de resguardo e de defesa de amplos espaços que dizem respeito a um poder central, recebendo tratamento periférico desde o centro de poder que a domina, em outro, ela não deixa de ser um campo de batalha, uma região rizomática e fragmentada que instaura uma falsa totalidade. Por conta disto, ao tratar de fronteira, devemos percebê-la como um espaço de negociação, de lutas, como uma ‘linha’ sempre em construção, como um espaço de circulação de alteridades e de afetos.

A alteridade é plural. O outro é sempre múltiplo. Na fronteira o outro é múltiplo. ‘Outros’ e ‘nós’ que são multiplicados pelos entreolhares de uns sobre os outros. Se o ‘nós’ e os ‘outros’ são múltiplos, múltiplas serão as formas pelas quais seremos afetados, assim como as formas pelas quais afetaremos. Na circulação desta alteridade os antigos ambientes afetivos se tornam ultrapassados para expressar novos afetos - movimentos de transformações que se fazem pela e na destruição e no evaporar de certos mundos, de certas configurações culturais, de certas relações sociais, de certos sentidos e de certas fronteiras. Sentidos que se perdem, que deixam de ser, que somem, e no reverso, sentidos que vêm, se acham, que passam a ser, que aparecem. As linhas que traçam as fronteiras são também linhas de conexão. Fronteira móvel, que debita a fronteira oficial, que faz circular outros e mais outros que os territórios institucionalizados não retêm.


Alexsandro

Por uma ética antipatriótica

Não há noção de Pátria que não traga uma dose exagerada de idolatrias, doutrinas e farsas. Todo ato de adoração à Pátria é um ato de adoração aos crimes que foram cometidos para que esta aparecesse e se mantivesse.
Quem ama uma Pátria faz de tudo para que outros também a amem. Não há fervor patriótico sem uma gama considerável de intolerância, fé cega, intransigência ou proselitismo.
A Pátria é uma assassina em potencial. Há na história humana dois motivos pelos quais mais se matou ou se morreu: por um deus ou por uma pátria. Devoção fervorosa e sangue. Gemidos e hinos. Fé religiosa e devoção patriótica se igualam no número de vítimas que fizeram. Os mais violentos crimes foram e são cometidos em nome de uma ortodoxia, religiosa ou política, não importa.
Daí o patriota e o fanático religioso se confundirem. E por serem como são, eles são um perigo. Os melhores e mais eficazes assassinos podem ser encontrados entre os patriotas e fanáticos religiosos: morrem e matam em nome de uma crença, de uma ficção.
A pátria é um conjunto de signos: honrar uma pátria, fazer guerras por uma pátria. Não perceber que por causa dela a vida deixa de criar, que o sangue que ela faz correr e o sangue que ela exige em nome de "proteção" é o mesmo sangue que poderia estar sendo dirigido para uma vida mais cheia de possibilidades.
O que alimenta tal atitude patriótica é a incapacidade de compreender a complexa trama de elementos que envolvem a construção do seu conteúdo e do seu funcionamento. Havendo, por conseguinte, uma redução dos seus elementos componentes dentro de uma elaboração de visão de mundo extremamente centrada em um conteúdo moral. A incapacidade de compreender e de conceber a pátria como uma invenção, como uma construção, pode levar a geração de um conteúdo moral que busca evitar qualquer esforço reflexivo, qualquer análise sobre as implicações de se viver sob um regime patriótico. Esse conteúdo moral pode chegar às raias da crueldade, da brutalidade, do totalitarismo e do fascismo. Tal conteúdo moral quase sempre desqualifica os esforços do pensamento criterioso e analítico. Assim, a incapacidade de autocrítica, somada a condenação a qualquer tipo de crítica, fazem do “patriocentrismo” uma atitude arrogante, fundada em idéias preconcebidas, tendo seus discursos calcados em pressupostos arbitrários, caprichosos e injustos.


Alexsandro

15/11/2010

Uma lição foucaultiana

Se for verdade que há sempre algum poder presente em qualquer empreendimento de saber e que não é possível desfazer essa relação, então qual a saída? Como tirar o poder do saber? Como deixar o saber apenas nele mesmo? Cairemos sempre nessa teia? Não sei. Talvez isso não seja possível. E se ao invés de lutarmos para acabar com a relação saber-poder fizéssemos exatamente o contrário, ou seja, disseminássemos o máximo possível a informação (o saber) que o poder encontra-se presente em todas as relações? Que o trabalho de produção do saber é também um trabalho de produção de poder?
Se o trabalho de produção do saber nunca estará completo, logo, o poder nunca terá uma forma definida. Se a produção do saber, e junto com ela a arte de pensar e a arte de escrever, sempre estarão em curso, também estaremos sempre no meio do labirinto do poder, um inelutável labirinto de paredes móveis, mas sem saída.
Se o saber é sempre algo em produção (uma produção infinita) e se o poder é um labirinto, como então se mover nesse labirinto sem ser esmagado por suas paredes móveis?
Talvez a resposta seja: continuar pensando. E junto com o pensar, escrever. Ou dito de outra forma: construir. Construir frases. Ir do início ao fim de uma página. Trabalho braçal. O trabalho de escrita deve atravessar o escritor pelo meio, desmontá-lo e reconstruí-lo em cada frase, tornando-o sempre outro. Outro sempre fugidio, sempre de difícil compreensão para o poder, sempre buscando ser “incapturável”. Ensinando-lhe não apenas novas maneiras de compreensão e entendimento, mas também produzir formas de confundir. Como? Produzindo um saber para outro poder na medida em que este faça ruir a base daquele saber que é imprescindível a manutenção do poder estabelecido.

Resumindo: aceitar que não tem como fugir da relação saber-poder e fazer uso dela, tramando uma produção de saber-poder sempre contestatória.


Alexsandro
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A leitura como arte do silêncio



Há pouco chegou em minhas mãos um livro que, entre outras qualidades, possui uma poesia e delicadeza fenomenal, mas não menos áspero e cortante. Refiro-me à "Nietzsche e a Educação" de Jorge Larrosa . Nele Larrosa dança, canta, pulsa, grita Nietzsche por todas as páginas. É uma escrita invejável. E é com esse sentimento de inveja que escrevo agora.
Em um dos capítulos do livro, intitulado “Ler em direção ao desconhecido. Para além da hermenêutica”, Larrosa descreve a experiência da leitura em Nietzsche: que tipo de leitor o Nietzsche espera para seus livros, como se devia lê-los, como usar todo o corpo na leitura, como dançar com os seus livros. Citando trechos de livros de Nietzsche, Larrosa aponta que este “exige para si mesmo ‘leitores perfeitos, filólogos rigorosos’, pessoas capazes de ler devagar, com profundidade, com intenção profunda, abertamente e com olhos delicados”. Claro que não é minha intenção tentar aqui interpretar ou discutir as implicações dessas exigências de Nietzsche apontadas por Larrosa. Desejo apenas apontar quão diferentes leitores seriamos se fossemos o tipo de leitor que Nietzsche esperava para seus livros.
Larrosa escreve dizendo que Nietzsche

"Sabe que a arte da leitura é rara nesta época de trabalho e de precipitação, na qual temos que acabar tudo rapidamente. Os “leitores modernos” já não têm tempo para esbanjar em atividades que demorem, cujos fins não se vêem com clareza, e das quais não podem colher imediatamente os resultados. Para eles, profissionais da leitura, o trato com os livros é, quando muito, um meio ‘para escrever uma resenha ou outro livro’, isto é, uma atividade na qual o que se lê é meramente apropriado em função de sua utilização apressada para a elaboração de um outro que deverá, por sua vez se consumir rapidamente."

Em outro momento Larrrosa (Nietzsche) diz:

"O leitor moderno está tão crente de “sua pessoa e sua cultura” que se supõe a si mesmo “como uma medida segura e um critério de todas as coisas”; é tal sua arrogância que se sente capaz de julgar – isso sim, criticamente – todos os livros; ele é constitutivamente incapaz de suspender o juízo, de guardar silêncio, de manter-se retirado, de escutar. Será que é isso que se ensina nas escolas? Em nossas escolas, incluindo as universidades, já não se ensina a estudar. O estudo, a humildade e o silêncio do estudo, é algo que nem sequer se permite. Hoje, já ninguém estuda. Mas todo mundo tem que ter opiniões próprias e pessoais. Os jovens pitagóricos tinham que guardar silêncio durante cinco anos. Mas nós, leitores modernos, parecemos incapazes de permanecer calados sequer durante cinco quartos de hora.”

Assim, como falei acima, quero intencionalmente plagiar Nietzsche (Larrrosa) no sentido de apontar as qualidades de um leitor ideal:
- deve possuir um espírito de profundidade, abertura e delicadeza;
- deve conhecer o segredo de ler nas entrelinhas;
- não deve permanecer na literalidade do texto, e
- que, sobretudo, pratique a arte venerável da leitura, o saber tornar-se silencioso e pausado.
...
...
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Alexsandro
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04/11/2010

Coerência

Um amigo professor contou-me que em uma de suas aulas começou uma discussão sobre aborto. A grande maioria optou, em meio a um debate acalorado, por ser contra. Colocado contra a parede, foi questionado sobre como era possível que ele, um professor universitário, fosse a favor de algo tão bárbaro. Os argumentos usados foram de todos os tipos, a maioria deles conhecidos por todos. Lá pelas tantas, uma das alunas fez a seguinte proposta: "Professor, pergunta sobre quantas aqui já usaram a pílula do dia seguinte". Silêncio geral. Constrangimento geral.

Moral da história? Como é triste não sabermos avaliar as coisas corretamente. Como é triste acreditarmos que só pelo fato de usarmos as mesmas palavras, crermos que estamos falando da mesma coisa. Como é triste avaliarmos os outros pelo limite do nosso entendimento.

Entre outras coisas, é chegada a hora de possibilitarmos que a coerência faça parte integrante de nossas práticas.
Alexsandro

A queda do Muro de Berlin e a queda dos pêlos pubianos




Em muitos momentos do século XX os filmes pornográficos estavam ligados não apenas às práticas libidinosas como também às criticas a repressão, sobretudo a repressão da própria libido como expoente de uma repressão geral da sociedade. Larry Flint foi um dos personagens símbolo dessa postura anarco-porno dos anos de 1970. Em muitos roteiros, por trás de muita sacanagem sexual, existiam também sacanagens políticas. Enrabar uma loira peituda, o grande símbolo da cultura americana, era um ato simbólico de enrabar os Estados Unidos. Estávamos em meio à guerra fria. Mas, como todos sabem, os Estados Unidos venceram a guerra. E a grande imagem dessa vitória, que é também uma vitória do capitalismo, é a queda do muro de Berlin. No campo da sexualidade, o equivalente pornografico da hegemonia capitalista e americana é a queda dos pêlos pubianos. Tais quedas representaram o avanço da hegemonia americana e capitalista sobre as práticas políticas cotidianos. Assim como a queda do muro de Berlin representou um golpe nas utopias políticas do século XX, a queda dos pêlos pubianos aparece como o novo símbolo desse controle sobre o corpo e suas práticas.
Se nos anos de 1950 os filmes com a “família feliz” era o sonho dourado que saia dos cinemas e invadia os projetos pessoais, hoje percebemos que os filmes pornôs deixaram de ser lixo cinematográfico e viraram referências para muitas das práticas cotidianas. É curioso perceber que sua influência vai desde seios siliconados, pêlos depilados, práticas, posturas e posições sexuais, até a invasão do imagético cotidiano de todos em termos de relações (afetivas e sexuais) possíveis.
Alexsandro
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30/10/2010

Honrar pai e mãe (e os outros legítimos superiores)

A família infantiliza a criança de uma maneira monstruosa. Quando não é o bibelozinho da casa ou o xodozinho, é o reverso disso, o monstrinho, o idiota bobão que não sabe nada, que não tem nada a dizer, que não presta para nada. Em outro extremo nós encontramos crianças de 5 anos sobrevivendo pelas ruas na companhia de outras crianças. Em tribos indígenas meninas de 12 anos possuem as mesmas responsabilidades dos adultos. Não entendam que desejo que esses exemplos sejam nosso parâmetro, não se trata disso, trata-se de outra coisa. Trata-se de entender que nós paralisamos as crianças. Elas poderiam estar rendendo mil vezes mais do que estão rendendo, mas não estão. E a culpa é da família. É da F-A-M-Í-L-I-A! ! !
A criança responde a educação que recebe: se for tratada como bobona, ela vai agir como bobona, se for tratada como alguém cheia de potenciais, ela responderá como tal. Os pais são os parâmetros. E, ao contrário do que se imagina ou se fala, pais e mães brasileiros são uma lastima: um número absurdo de pais são alcoólatras, outros tantos são ausentes. As mães são as maiores propagadoras de preconceitos, dos mais variados tipos. A família é a primeira e maior inimiga à qual as crianças têm de sobreviver.
Vencemos muitos momentos ruins. Talvez é chegada a hora de começarmos a maior batalha enfrentada por homens e mulheres: vencer pai e mãe.
Alexsandro
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26/10/2010

A inteligente arte de não ler

Gosto muito de um pequeno artigo que li já faz um tempo - "Os cinco livros que mais me influenciaram". Ele é de fato uma entrevista na qual Derrick Jensen falar sobre livros e leituras. Interrogado sobre qual livro o fez perceber que alguma coisa estava errada com o planeta, o sistema político, o sistema econômico, etc. Assim respondeu ele:

Não foi um livro. Foi a destruição de lugar após lugar que eu amava. E foi a completa insanidade de uma cultura onde tantas pessoas trabalham em trabalhos que elas odeiam... A própria cultura me convenceu de que alguma coisa estava errada, ao ser tão extraordinariamente destrutiva da felicidade humana, e, muito mais importante, do próprio mundo.

O que ele quis dizer? Na continuação de sua argumentação ele nos faz entender, entre outras coisas, que não é qualquer leitura que faz bem ou que vale a pena. Fazer todo mundo ler pode parecer uma atitude correta, mas depende muito daquilo que será lido, caso contrário, não vai fazer muito diferença. Enfim, de nada adianta trocar o analfabetismo por outra visão estreita do mundo. Uma “boa formação” (e eu não tenho certo o que isso significa) depende também do que se lê. Por exemplo, citar um livro como "O Código Da Vinci" como referência de boa leitura não me parece uma boa postura. Tal questão já nos remete a uma arte muito estranha e pouco falada: a arte de não ler. É o filósofo Schopenhauer quem dirá:

"... no que se refere a nossas leituras, a arte de não ler é sumamente importante. Esta arte consiste em nem sequer folhear o que ocupa o grande público, o tempo todo, com panfletos políticos ou literários, romances, poemas, etc., que fazem tanto barulho durante algum tempo, atingindo mesmo várias edições no seu primeiro e último ano de vida: deve-se pensar, ao contrário, que quem escreve para tolos sempre encontra um grande público..."

Após fazer essa dura crítica, ele sugere que por conta do nosso pouco tempo, devemos voltar nosso interesse

"para as obras dos grandes espíritos de todos os tempos e de todos os povos, para os homens que se destacaram em relação ao resto da humanidade e que são apontados pela voz da notoriedade. Apenas esses espíritos realmente educam e formam os demais."

A preocupação aqui é com o fato simples que muitas vezes esquecemos, qual seja, ler livros ruins emburrece. Sobretudo quando temos claro que muitos daqueles livros só foram escritos para serem vendidos, pouco importando seus conteúdos. Ou como ele diz em forma de crítica a esse mercado editorial: “Nove décimos de toda a nossa literatura atual não possui outro objetivo senão o de extrair algum dinheiro do bolso do público.” Dizendo de outra forma, o fato de ter sido impresso não significa que seja de boa qualidade ou que mereça ser lido. O interesse financeiro, independente da qualidade, acontece abertamente.
O gesto da leitura não é um gesto fácil. O gesto da escrita não é um gesto fácil. E em um contexto que é regido pela máxima de que uma “imagem vale mais do que mil palavras”, não é fácil competir com isso, sobretudo quando ela gera o engano de se achar que "imagem" e "palavra" competem entre si, quando, de fato, uma completa a outra. Neste sentido, uma leitura se torna significativa quando temos capacidade de refletirmos sobre o que foi lido. Além do mais, há leituras que precisam de uma preparação, precisamos das chaves para abrir e fechar cada página. Assim, a crítica em forma de conselho de Schopenhauer ainda possui a mesma vitalidade de quando foi escrita a mais ou menos uns 150 anos:

“Para ler o que é bom uma condição é não ler o que é ruim, pois a vida é curta, o tempo e a energia são limitados.”

A experiência da leitura tem a ver com o sentido que damos a essa leitura. Cada linha que lemos deveria nos remeter a linhas de vida. Deveriam funcionar como um mecanismo de desentrave – um mecanismo que vai abrindo novos territórios, nos desalojando, nos tirando da zona de conformo e nos fazendo pensar e ver de uma maneira totalmente outra. Se assim não for, digo, é uma leitura inútil.
Alexsandro
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Há uma gereção do conhecimento?

1. Será que se as crianças tivessem consciência do que os seus pais estão fazendo com elas hoje, elas aceitariam de bom grado? Será que elas ficariam felizes se tivesse consciência de que estão sendo educadas para se tornarem apenas alguém capaz de ser explorado pelo mercado?

2. Toda nossa educação tem como meta o mercado? É isso? Filas e filas de educadores enchem salas de aulas para fazer essa meta ser alcançada? Será que é desse tipo de educador que realmente precisamos?

3. A decadência da nossa cultura não é exatamente porque faltam educadores ou uma educação que vislumbre outras preocupações para além do mercado?

4. O que nossas escolas conseguiram fazer conosco até hoje não foi senão um adestramento violento, tornando um crescente número de homens e mulheres apenas qualificados para serem explorados pelo mercado. É mais disso que precisamos que nossas escolas façam com as crianças? Se for, não é a nossa visão realmente muito estreita?

5. Há no Brasil alguma escola que ofereça uma educação "nobre" para as crianças? Quando falo em educação nobre quero dizer, uma educação que não seja dirigida pela mediocridade do estado ou de um empresário. Nossas escolas estão entupidas, nossos professores sobrecarregados e tornados estúpidos. Por que isso não é um escândalo?
Alexsandro
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20/10/2010

Pode parecer estranho, mas professor tem que estudar

A crença na afirmação de que ser professor é um dom, não faz mais sentido. O magistério é uma profissão e, como todas as outras, requer empenho. Isso significa que professor não funciona por inspiração, professor tem que estudar e estudar muito. Professor que não estuda, que não lê, e quando digo ler, estou falando de boas leituras, leituras teóricas dos conteúdos, deveria comprar uma corda e se enforcar (opa! escapou), digo, deveria procurar fazer outra coisa.
No momento em que escrevo esse texto ( pouco depois da meia noite), um vizinho idiota passa com o som do carro a toda altura, fazendo todos nós ouvirmos uma música também idiota, provando para todo nós o quão idiota ele é, e eu fico me perguntando, quem educou esse idiota? Esse homem obrigatoriamente passou por uma escola, pode até ter feito um curso superior, e eu pergunto: o que saiu errado? Não sei. Podemos pensar em mil respostas, inventar mil desculpas, mas uma delas infelizmente tem a ver com o nosso tipo de educação escolar e com a formação dos professores que se encontram nessas mesmas escolas.
Somos parte de uma sociedade violenta, corrupta, ignorante e infeliz. As provas estão por todos os lados, basta abrir os olhos e olhar. Nossa cultura é um desastre. Nosso sistema de ensino é medíocre. Nossa política é suja. Nossa economia é um crime. O nosso modelo de família é um poço de neuroses. E a educação escolar que deveria servir para nos tornar melhores, pessoas melhores, não está fazendo isso. De fato, o que estamos testemunhando é um roubo. As escolas estão roubando a vida das crianças e dos adolescentes. A maior parte do tempo gasto na escola é puro desperdício. Troca-se a infância pelo que? Por algo muito ruim. Milhões de crianças têm gastado milhões de horas nas escolas para se tornarem o que? Um neurótico com diploma é a mesma coisa que um neurótico sem diploma. O estudo, no modelo como ele se apresenta hoje, é puro desperdício de tempo. O que nossos anos de estudos nos fizeram compreender? Quais as coisas realmente significativas que aprendemos, a ponto de mudarmos nossa forma de ver o mundo e sua complexidade? Ou, como dirá José Ângelo Gaiarsa: “O que restou em você depois de quinze anos de perda de tempo, sentado em uma cadeira, fazendo sabe-se lá o quê? Quinze anos de tortura e tédio, cujo conteúdo poderia ser aprendido em um ano, se alguém estivesse interessado nesse sentido.”
Alexsandro
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18/10/2010

As grandes feridas narcisicas

Foram três as grandes “feridas narcísicas” sofridas pela humanidade, segundo Sigmund Freud. A primeira, a perda de nossa ilusão de estarmos no centro do cosmos gerada pelas descobertas de Copérnico e o reconhecimento pleno do heliocentrismo; a segunda, a “degradante” descoberta darwiniana da evolução das espécies, que deu a nosso narcisismo a “má notícia” de que não somos criaturas saídas das mãos de um deus, mas meros descendentes dos primatas, macacos melhorados; e, em terceiro lugar, a própria psicanálise freudiana, que mostrou que “o ego não é rei em sua própria casa” e escancarou o quanto o comportamento humano é guiado mais por impulsos inconscientes e pulsões biológicas do que por princípios racionais.
Mas a ferida narcísica que o proprio Freud inflingiu talvez seja mais profunda do que ele mesmo previu: sua teoria a respeito da religião e das raízes da necessidade psicológica da fé também representam ferimentos severos à auto-imagem de todos os Narcisos que queriam continuar a crer que são os “favoritos da Criação” e que havia um “plano divino” dedicado a construir a felicidade humana… Como diz Freud numa frase inesquecível, dum pessimismo à la Schopenhauer, “somos tentados a pensar que não entrou no plano da ‘Criação’ a idéia de que o homem fosse feliz”…
A Natureza, para um ateu de lucidez tão implacável como era Freud, jamais foi vista através da névoa distorcedora do idealismo ou do antropomorfismo. A Natureza, para o Pai da Psicanálise, evidentemente não é criação de um Deus Onipotente, Bom e Sábio. Não é algo que esteja aí para nos “agradar”, nos deleitar, nos receber calidamente em seu seio. Nem está “do nosso lado”, pronta a atender nossos desejos e preces. Seria uma ilusão humanizá-la, sentimentalizá-la, “encantá-la” e supor nela intenções, desejos, desígnios e vontades. Para Freud, a Natureza, na verdade, é um imenso aglomerado de Forças e Energias que, em sua totalidade, escapa totalmente ao nosso controle. “Ela nos destrói, fria, cruel e incansavelmente”, aponta ele, antes de enveredar por exemplos ilustrativos:

“os elementos, parecem escarnecer de qualquer controle humano; a terra, que treme, se escancara e sepulta toda a vida humana e suas obras; a água, que inunda e afoga tudo num torvelinho; as tempestades, que arrastam tudo o que se lhes antepõe; as doenças, que só recentemente identificamos como sendo ataques oriundos de outros organismos, e, finalmente, o penoso enigma da morte, contra o qual remédio algum foi encontrado e provavelmente nunca será. É com essas forças que a natureza se ergue contra nós, majestosa, cruel e inexorável; uma vez mais nos traz à mente nossa fraqueza e desamparo, de que pensávamos ter fugido através do trabalho de civilização.” (O Futuro de Uma Ilusão, pg. 96)

Jacques Lacan, em seu Discurso aos Católicos, sublinhou que o pensamento de Freud, como já começamos a suspeitar, não concebe uma Natureza que possua “desvelos humanistas” ou que seja “sensível” aos sofrimentos e aos prazeres humanos. Ela é indiferente.

“Não, a reflexão de Freud não é humanista. Nada permite aplicar-lhe esse termo” (pg. 34), afirma Lacan. “A realidade física é totalmente inumana. (…) Sabemos o que cabe à terra e ao céu, ambos são vazios de Deus…” (pg. 40) Lacan sugere mesmo que à Freud “a própria dor parece-lhe inútil. Para ele, o mal-estar da civilização resume-se nisto: tanto sofrimento para um resultado cujas estruturas terminais são antes agravantes…” (pg. 34) [LACAN, O Triunfo da Religião, precedido de Discurso Aos Católicos. RJ: Jorge Zahar, 2005.]

Não importa o quanto a Civilização avance, pois, com seu séquito de novos conhecimentos científicos e novas tecnologias; a Natureza “inumana” está sempre presente como um poder superior e ameaçador, desencadeando tempestades, terremotos, tsunamis e chuvas de cometa capazes de, por vezes, reduzir à pó milênios de árduo trabalho humano ou mesmo extinguindo espécies inteiras de animais. Descobrir-se em meio a um mundo natural tão hostil certamente gera tormentos psíquicos e crises de valor, como Freud aponta: “A auto-estima do homem, seriamente ameaçada, exige consolação; a vida e o universo devem ser despidos de seus terrores; ademais, sua curiosidade pede uma resposta.” (O Futuro de Uma Ilusão, Os Pensadores, pg. 96)

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17/10/2010

Igualdade - um outro principio (II)

De fato, a igualdade entre nós pode ser representada por um único quesito: o quão insignificantes somos perante as forças da natureza.

Nataly

16/10/2010

Fraternidade - um outro principio

A noção de fraternidade deve ser pensada não mais a partir do conceito de cidadão, mas de espécie. Devemos nos perceber como mais uma espécie em um ecossistema e sermos fraternos com as outras espécies também.
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Igualdade - um outro principio

Os discursos que afirmavam que somos todos iguais não mais se sustentam, as diferenças entre nós existem, são muitas e precisam ser compreendidas.


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Liberdade - um outro principio

Outra idéia que caducou é a da nossa noção de liberdade. A velha formula que dizia que a liberdade de um começa onde termina a do outro, já não funciona. Outro principio se apresenta indicando que a liberdade de um só é possível com a liberdade do outro.
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O professor entre a evidência e a prudência

Qual deve ser o papel fundamental de um professor? Alguém dirá que é ensinar. Mas ensinar o que e em qual direção? Assim, quando nos deparamos com questões do tipo: Até que ponto considera a educação um instrumento para a formação de homens sábios e virtuosos? As perguntas que devemos fazer são: O que é um homem sábio e virtuoso? E para tanto, o que deverá ser ensinado? Quem vai ensinar?
Não é minha intenção responder tais perguntas, gostaria apenas de apresentar alguns pressupostos para discussão:

1. Cabe ao professor ensinar que aquilo que assumimos como verdade tem uma história que precisa ser conhecida, analisada, criticada e, em muitos casos, destruída.
Exemplo: Hoje em dia fala-se muito em sucesso. É um discurso tido como óbvio, como verdadeiro, pois é um assunto que vemos presente na mídia, nas escolas, nas conversas cotidianas. Muitos afirmarão que é sábio buscar sucesso em todas as áreas da vida, principalmente o profissional. Mas o que é sucesso? Para que serve sucesso?
Imaginemos alguém que foi de pobre a rico, de simples mortal a celebridade, de desempregado a diretor de empresa. O que tais mudanças provocam em alguém? Quais os efeitos que mudanças assim provocam nas pessoas? São só mudanças positivas? Não sei, de fato tenho cá minhas dúvidas. Alguém pode contestar dizendo que é melhor tomar antidepressivo dentro de uma Ferrari a ficar ouvindo piadas dentro de um ônibus. Tudo bem, podemos até concordar, mas essa anedota evidência o que queremos dizer aqui: que não há sucesso sem crise e que nem todos estão preparados para as mudanças que o sucesso traz. O pressuposto básico por detrás de afirmações sobre o sucesso é o de que todos estão aptos para viver tudo e qualquer tipo de experiência que o sucesso possibilita, mas não é assim. Nem todos estão preparados para o peso e as responsabilidades da nova posição. Assim, nem tudo que é apregoado sobre o sucesso é verdadeiro e cabe a nós professores sermos os primeiros a questionar o valor de tais afirmações.

2. Um professor deve trabalhar com evidências. Um professor deve aprender ele mesmo, antes de qualquer outra coisa, a trabalhar com evidências, com fatos. Entendendo por evidência tudo aquilo que pode ser usado para provar que uma determinada informação ou afirmação é verdadeira ou falsa. Buscar sempre evidências e argumentos para sustentar o dito, o falado.
Exemplo: Acima usei a noção de sucesso afirmando que se divulga e se propaga uma idéia totalmente equivocada do seu significado. Como posso evidenciar isso? Como posso provar minha afirmação? No espaço deste pequeno texto não tenho muita possibilidade de fazê-lo de forma correta e coerente. Usarei apenas os comentários do psicanalista Jorge Forbes a respeito do assunto como forma de validar meus argumentos.
Explicando como nossa sociedade deixou de ser guiada por valores que tinham nas “hierarquias verticais” seu ponto de apoio - a hierarquia dos mais velhos sobre os mais jovens, por exemplo - e que isso trouxe como conseqüência a falta de referências. Referências que eram usadas para encontrar respostas ou apoio para suportar uma angústia que se fazia presente, Jorge Forbes aponta que agora temos as angustias, mas não sabemos o que fazer com elas. Se até bem pouco tempo valiam as afirmações do tipo: "eu sou mais velho, sei do que falo", "sou mais experiente, siga meu exemplo", hoje tais afirmações já não possuem o mesmo significado. Já não temos o “mais velho” para nos guiar. E sem guia ficamos desnorteados.
"O resultado está aí: a série que deveria ser: descoberta, sucesso, fama, dinheiro, conforto e satisfação, tem sido: descoberta, sucesso, fama, dinheiro, mulheres, drogas, violências, desastres, prisão ou ostracismo. Podemos pensar em uma explicação paradigmática, além das particularidades de cada caso, o que o mais das vezes só anda tampando o sol com a peneira: foi o pai violento, a mãe alcoólatra, as más companhias, a péssima educação, o irmão psicopata, etc. Ocorre que a saída da pobreza e do anonimato para a riqueza e a fama, subitamente, gera uma forte crise de identidade. Ter sucesso é cair fora; na palavra sucesso, tem a raiz ceder, cair. Quem tem sucesso cai fora do seu grupo habitual de pertinência. Jobim não tinha razão quando dizia que o brasileiro não desculpava o sucesso, pois nenhum povo desculpa, só variam as maneiras de demonstrá-lo. A máxima de Ortega y Gasset ainda é válida: “Eu sou eu e a minha circunstância”. E quando a minha circunstância muda abruptamente, fica a pergunta profundamente angustiante: - “Quem sou eu?”, que fundamenta a crise de identidade. Aí, com freqüência a pessoa se aliena em uma identidade forjada, aquela que fica bem na fotografia, a máscara; surge assim o mascarado. Quantos e quantos jogadores de futebol não se transformaram em mascarados diante dos nossos olhos? E a coisa não pára por aí. A máscara não é suficiente para dominar a angústia causada pelo sucesso, vindo, em seguida, um sentimento terrível de ilimitação, de poder tudo. Quer alguma coisa, compra; quer um amor, toma; quer ter razão, impõe. Esse sentimento de quebra de fronteiras pede um basta que não raramente aparece da pior forma: no insulto, no acidente, na morte. Alguns têm a sorte de passarem por um desastre controlável e depois conseguem se recuperar, carregando beneficamente a cicatriz de sua desventura, mas muitos e muitos vão e não voltam.”

3. Se tivermos de falar em virtudes, falemos da prudência. Não há mal algum no exercício de alguém que sabe mais do que outro informar o que é preciso saber e fazer, enfim, ensinar. O problema se encontra no tipo de informação que é transmitida e na forma que essa relação acaba por se configurar, ou seja, quais os efeitos de dominação que aparecerão nessa relação. Efeitos de dominação que farão com que um menino ou uma menina sejam subjugados à autoridade arbitrária de um professor.
Alexsandro
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07/10/2010

Perto do Coração Selvagem

- O que é que se consegue quando se fica feliz?, sua voz era uma seta clara e fina. A professora olhou para Joana.
- Repita a pergunta...?
Silêncio. A professora sorriu arrumando os livros.
- Pergunte de novo, Joana, eu é que não ouvi.
- Queria saber: depois que se é feliz o que acontece? O que vem depois? - repetiu a menina com obstinação.
A mulher encarava-a com surpresa.
- Que idéia! Acho que não sei o que você quer dizer, que idéia! Faça a mesma pergunta com outras palavras...
- Ser feliz é para se conseguir o quê?


Clarice Lispector

Mensagens de auto-ajuda

Aqueles que não se suportam culpam os outros pelo mal do mundo.

Já disse, para um idiota não existe argumento.

Qual o motivo de muitos não me entenderem? Entender seria descobrir-se errado e isso configuraria seu próprio inferno.


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Eu sou a minha queixa

É habitual que a expressão da queixa exagere em muito a dor, até o ponto em que a dor acaba se conformando ao exagero da queixa, aumentando o sofrimento. É comum as pessoas acreditarem tanto em suas lamúrias que acabam emprestando seu corpo, ficando doentes, para comprovar o que dizem.
A causa primordial de toda queixa é a preguiça de viver. Viver dá trabalho, uma vez que a cada minuto surge um fato novo, uma surpresa, um inesperado que exige correção de rota na vida.
oda queixa é narcísica.
Todo mundo se queixa o tempo inteiro. Do tempo: um dia do calor, outro dia do frio. Do trabalho: porque é muito ou porque é pouco. Do carinho: "que frieza" ou "que melação". Da prova: "dificílima" ou "fácil demais", E dos políticos, e da mulher, e do marido, e dos filhos, e dos tios, avós, primos; do pai e da mãe, enfim, de ter nascido. A queixa é solidária, serve como motivo de conversa, desde o espremido elevador até o vasto salão. A queixa é o motor da união dos grupos, é sopa de cultura social - quem tem uma queixa sempre encontra um parceiro. A queixa chega a ser a própria pessoa, seu carimbo, sua identidade: "Eu sou a minha queixa".
Jorge Forbes
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Sobre a decisão

Não podemos esperar que nossa decisão seja compreendida. Porque, se fosse compreendida, ela seria razoável, e aquilo que é razoável não é decidido no risco. Normalmente, aquilo que é razoável é chato. E aquilo que é decidido é apaixonante. A decisão se decide na paixão. Decisão e paixão estão juntas.
E aqueles que não conseguem se decidir ficam deprimidos. Nesse caso, a depressão é uma covardia diante da decisão. Por isso Lacan diz que, quando a pessoa cede em seu desejo, fica deprimida. A pior coisa que alguém pode fazer é estender um lenço de papel a um deprimido. Isso o solidifica em sua posição narcísica, de autopiedade.
A felicidade é uma responsabilidade humana. Não é para os covardes.
Para tomar a decisão, é necessário que a pessoa se pense. Só podem ter dúvida os sujeitos divididos. Assim, o primeiro aspecto sobre a decisão é que ela é vinculada à dúvida. O segundo aspecto é: gostamos ou não da decisão? Se fôssemos fazer uma pesquisa sobre o assunto, provavelmente mais de 90% das pessoas diriam que não querem tomar decisões. A linguagem é cheia de expressões para poupar alguém de decidir. A mais famosa é "seja o que Deus quiser", maneira clássica de não tomar decisões.
Temos horror da decisão porque toda decisão implica risco.

Nem todo mundo evita a decisão. Há quem goste dela. Os artistas e os poetas, por exemplo, gostam.

Jorge Forbes
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02/10/2010

“Professor, por que o senhor só fala de sexo?”

Procure visualizar a seguinte cena. Um professor qualquer passar dois meses falando cerca de 4 horas por semana, o que conta mais ou menos 32 horas, sobre coisa do tipo: a cristandade com sua sociedade homogênea e com uma cosmovisão estática e fechada devido a uma razão limitada por verdades teocêntricas. Depois engrossa o caldo com um pouco de renascimento, humanismo moderno, ciência moderna e segue apresentando os fundamentos filosóficos e políticos da modernidade - o sujeito e sua razão autônoma, o pensamento racionalista e individualista. Depois René Descartes e o tal do Cogito: “penso logo existo”. Empirismo inglês, Thomas Hobbes (o homem é o lobo do homem). Isaac Newton, Galileu, para tentar entender os motivos que nos levaram a tratar a natureza não mais objeto de medo e contemplação, mas como algo a mercê das nossas vontades. Nicolau Maquiavel, O Príncipe, o estado monárquico centralizado. Reforma protestante. Revolução Francesa. Os novos processos de produção que vão gerar a acumulação de capital. A revolução industrial. O pensamento liberal. Os processos que culminaram nas diferenciações presentes nas esferas sociais, políticas e econômicas da sociedade de mercado. A secularização das artes e das ciências. O aparecimento da cultura de massa. A crise da modernidade, a razão instrumental, a indústria cultural, o mercado, o ser humano transformado em objeto, a crise ambiental, miséria, fome, violência, guerra, solidão, depressão, império do lucro e do mercado. A razão moderna e as promessas não cumpridas de felicidade e prosperidade. A perda da fé na razão e vazio de sentido. O desencanto (tendo Weber como referência). Os mitos modernos, o progresso, a diversão, o consumo. A perda das referências históricas. A esquizofrênica busca do novo. A modernidade líquida de Bauman. A sociedade disciplinar de Foucault. Lyotard e a decomposição dos grandes relatos. A sociedade de consumo... Ai, no meio dessa salada de idéias e conceitos, o tal professor, em certo momento, cita Freud e seu conceito de desejo, com tudo que ele implica, para, em seguida, citar também Deleuze e como este conceituou o desejo de maneira diferente do de Freud. Não é que, para sua surpresa, de repente, sem a menor cerimônia, uma pergunta ecoa no ar da sala: “Professor, por que o senhor só fala de sexo?”


Qual a resposta mais adequada que se pode oferecer a uma criatura numa situação assim configurada? Não sei vocês, mas eu tomo o partido da filosofia do palavrão cunhada por Olavo de Carvalho.


A sociedade da decepção - Gilles Lipovetsky

A sociedade da decepção é o título de um dos livros de Gilles Lipovetsky e o tema central é o que o próprio título indica: como a decepção se tornou uma das marcas distintiva da nossa experiência.
Abaixo segue uma citação do livro no qual ele surpreende ao afirmar que nos decepcionamos nem tanto por desejamos os bens materiais que os outros possuem e não podemos ter. Superamos essa fase ou estamos em vias de superar, no entanto, ainda continuamos a desejar (ou invejar) bens não-comercializados (aquilo que o dinheiro não compra). "A inveja provocada pelos bens não-comercializáveis (amor, beleza, prestígio, êxito, poder) permanece inalterável".


"Ao fim e ao cabo, o mau uso dos bens públicos desperta mais indignação do que o uso de bens particulares. Com efeito, de que os consumidores se queixam mais freqüentemente? Dos engarrafamentos de trânsito, das praias superlotadas, do processo de descaracterização da paisagem natural por obra das construtoras de edifícios ou da invasão de turistas, da repugnante promiscuidade nos transportes coletivos, do barulho dos vizinhos, etc. Em outras palavras, o que gera decepção não é tanto a falta de conforto pessoal, mas a desagradável sensação de desconforto público e a constatação do conforto alheio.
Não surpreende, portanto, que seja no âmbito dos serviços, baseado no relacionamento entre as pessoas, que a decepção é mais freqüente. Manifestações de crítica são muito comuns contra o corpo docente das instituições de ensino, contra o mau funcionamento da Internet, contra o despreparo da classe médica...
Mas, em outra perspectiva, entretanto, convém não esquecer que, diferentemente do que ocorria no passado, os elos entre as pessoas e a esfera do consumo estão cada vez mais entranhados. Muito daquilo que compramos, não o fazemos com a finalidade de granjear a estima deste ou daquele, mas sobretudo visando a nós mesmos, isto é, tendo como objetivo aperfeiçoar os nossos meios de comunicação com o semelhante, melhorar o desempenho físico e a saúde do corpo, buscar sensações vibrantes e variadas formas de emoção, vivenciando experiências sensitivas ou estéticas. É nessa acepção que o espírito de consumo em benefício do outro, típico das antigas sociedades de classe, retrocede, dando lugar ao consumo para si. Em resumo, o consumo individualista emocional assume agora a dianteira em relação ao consumismo ostentador de classe. Simultaneamente, a tendência dominante é aceitar com maior naturalidade que outros possuam algo que não temos, porque a atenção de cada indivíduo está hoje mais voltada para a sua própria experiência íntima do que para o desempenho dos demais. Ao contrário dos primórdios da era democrática, que muito contribuiu para a disseminação do sentimento de inveja, na atual fase do hiperindividualismo consumista, muito mais raramente nos deparamos com aquele indivíduo que se dilacera interiormente por falta de poder aquisitivo para comprar o mesmo automóvel de alta qualidade do vizinho. A inveja provocada pelos bens não-comercializáveis (amor, beleza, prestígio, êxito, poder) permanece inalterável, mas aquela provocada pelos bens materiais diminui."
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A sociedade da decepção - Gilles Lipovetsky

A decepção é uma experiência humana universal desde sempre. Nas sociedades antigas, ela era restrita. Primeiro porque o desejo era mais limitado, existia uma cultura da resignação, resumida na expressão “é a vida”. E, depois, havia a religião, que limitava a decepção. A sociedade moderna fez explodir o sentimento da decepção. A democracia abriu o desejo das pessoas. Ela cria frustrações porque não suporta a desigualdade. E a era hipermoderna, que vivemos hoje, acelerou mais ainda a decepção, que agora está em todos os lugares, em todos os níveis sociais. Na política, por exemplo. As pessoas, em todos os países, estão sempre decepcionadas com a política. Com a globalização, não há mais a esperança revolucionária. É a era do direito do homem, e este é sempre inferior ao desejo. A escola. Antes ela tinha a virtude de permitir a ascensão social. Mas hoje temos jovens muito qualificados que trabalham em coisas que não correspondem a essa qualificação – e isso gera decepção.
As pessoas podem até se declarar felizes, mas isso não significa grande coisa. Há outros indicadores como a ansiedade no trabalho e com os filhos, taxas de suicídio e casos de depressão e dependência, que mostram como a sociedade de bem-estar é uma sociedade de frustrações. Depois dos anos 60, desenvolveu- se a idéia de que o consumismo cria a decepção porque mostra o que você não vai ter. Ou que você seria forçosamente frustrado porque, quando tem uma coisa, já sonha com outra, como se isso levasse a pessoa a uma decepção permanente.
O consumo de bens materiais não é tão produtor de decepções. Os objetos têm um valor pela novidade. Não é porque você não tem um Jaguar que o seu carro modesto não o satisfaz. Você pode gostar da sua casa, sem que ela seja um castelo. O consumo cultural é o que decepciona. Veja, por exemplo, a televisão. Ela é feita para ser um espetáculo, mas se você fica zapeando é porque o espetáculo não o satisfaz. O zapping é uma permanente decepção. A decepção mais forte, mais intensa, a mais cruel é a que você tem com outras pessoas. Então se engana quem culpa o consumo pela infelicidade. O que dá frustração é a individualização do mundo, é a relação com os outros e consigo mesmo.
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09/09/2010

Simples assim

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A palavra "Candidato" deriva do latim "Candidus" que significa branco, brilhante, alvo, puro.
A história é mais ou menos assim. Quem desejasse ser eleito a algum posto público, na Roma clássica, tinha de provar que era puro de alma para merecer os votos dos concidadãos. Neste sentido, os pretendentes apresentravam-se em público sempre vestidos de branco, a cor da pureza. Daí o "Candidatus", de "Candidus, que em latim quer dizer branco. Ou seja, o "Candidatus" era o pretendente a cargo público que se vestia de branco para provar pureza de intenções.
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A 'Politeia' e a 'Idioteia'

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Idiota
A palavra idiota deriva da antiga Grécia e nominava aquelas pessoas que não estavam integradas na vida pública grega. Referia-se aqueles que não se interessavam ou não participavam dos assuntos públicos. Devemos ter em mente que a vida pública era de grande importância para os gregos e alguém que dela não participava não era visto com bons olhos. Neste sentido, o termo acabou assumindo um significado pejorativo.
A raiz da palavra se encontra em ἴδιος (ídios), que significava o que era privado, particular, pessoal, aquilo que é próprio.
Com a mesma raiz encontramos termos como “idiossincrasia” que diz do temperamento, do caráter, daquilo que nos distingue dos demais, o que é próprio de um individuo ou de uma coletividade.
Temos ainda “idioma” (em grego ἰδίωμα , propriedade privada), fazendo referência a língua própria de um povo ou comum a vários.
Assim, idiota era alguém que se preocupava apenas consigo e com seus interesses privados ou particulares, sem dar atenção aos assuntos públicos ou políticos. Devemos ter em mente que na vida greco-romana a política assumiu um grande significado para os homens livres. Não é sem motivos que a palavra idiota assumiu uma conotação pejorativa, se tornando um insulto devido ao fato de que ser um idiota, ou seja, ser alguém que só se preocupa com suas próprias coisas, passou a ser alguém que trazia em si a insígnia da desonra de não participar da vida pública.

Um pouco mais

Desde os gregos, a referência inicial para pensarmos o intrincado da experiência humana se encontra nos conceitos de família (oikos) e de cidade (polis).
A fronteira entre a família e a cidade tinha como referencia a fronteira entre aquilo considerado privado e aquilo considerado público. O chão político (politeia) possuía conotação diferente do chão privado (idioteia). O espaço da "politeia" era reservado ao homem livre, que se definia por dois princípios: senhor da sua casa (superior aos demais que dele dependiam), mas, não mais que um igual entre os homens livres na comunidade política. Este espaço era também entendido como o espaço lingüístico, o espaço da palavra. Por sua vez, mulheres, crianças, escravos, enfim, os que não eram considerados livres, circulavam no espaço da "idioteia", delineavam seus movimentos no espaço privado, que era entendido como o espaço da não-palavra.
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28/08/2010

Apontamentos sobre os ciganos: a diferença causando repúdio







1. A palavra cigano é uma denominação vulgar para “rom” (ou “roma”, no plural). Constituem um povo de tradição nômade. Algumas interpretações mais aceitas indicam que são de origem indiana. Seja como for, o que os caracterizam atualmente é, sobretudo, a ausência de uma referencia histórica a algum país de origem. O problema que esse fato causa para eles é a falta de uma identidade de Estado ou cidadã que lhes possibilitem o reconhecimento como grupo étnico.

2. O preconceito contra os ciganos estimulou o surgimento de uma série de lendas contra eles: chegou-se a buscar na Bíblia elementos para aparentá-los a Caim e considerá-los amaldiçoados. Outra lenda aponta-os como aqueles que teriam fabricado os pregos da crucificação de Jesus de Nazaré.

3. Porajmos - Significa "devorar", é um termo cunhado pelo povo cigano Rom para descrever a tentativa do regime Nazista de exterminá-los. O fenômeno tem sido pouco estudado se comparado ao Holocausto judeu. Uma explicação para o esquecimento do extermínio cigano pelos nazistas se encontra no fato das comunidades ciganas serem menos estruturadas e organizadas do que outras que também sofreram com o regime nazista.

4. Atualmente o povo ciganos é o mais discriminado da Europa. (Sim, mais do que judeus e mulçumanos)
"O preconceito contra eles sempre existiu na Europa ocidental, sobretudo porque eles levam um modo de vida diferenciado, não tolerado pelo europeu. É uma cultura que o europeu não consegue apreender, porque baseada no oposto do que estamos acostumados, ou seja, em um máximo de estabilidade possível."
(Jean-Yves Camus, especialista em extrema-direita do Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas - IRIS)


5. Situação dos Ciganos na Europa ( o que segue são apenas exemplos de medidas tomadas contra os ciganos em alguns paises)

França
Parabéns a França por ser o berço da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, sistematizados em dezessete artigos e um preâmbulo, nos quais os ideais libertários e liberais da Revolução Francesa estão inscritos e por dar prova do seu valor na forma das ações do seu atual presidente Nicolas Sarkozy e seus ataques contra os ciganos, no caso, aqueles que vivem na França.

Itália
O governo italiano é outro que se coloca contra os ciganos. O governo passou a registrá-los, recolhendo impressões digitais, e a propor indenizações para a saída voluntária dos ciganos em situação ilegal do país. O "incentivo" compreendia 400 euros e uma passagem de avião para o país de origem. O ministro italiano do Interior, Roberto Maroni, membro da Liga do Norte, o principal partido de extrema-direita, pretende expulsar qualquer cigano que não seja domiciliado ou que dependa do sistema social do país.

Alemanha
A Alemanha incentiva a partida voluntária e promove expulsões regulares de ciganos tidos como ilegais.

Reino Unido
Nas últimas eleições para primeiro-ministro, uma das promessas de campanha do candidato conservador David Cameron, vencedor do pleito, foi a de reforçar a legislação contra a ocupação ilegal de terrenos vazios, visando, nas entrelinhas, à comunidade cigana. O projeto prevê a criação de um novo delito através do qual os policiais serão autorizados a prender pessoas que se recusam a deixar um terreno ocupado ilegalmente.

República Checa
As violências com ciganos fazem parte do cotidiano, inclusive por parte do governo. O Estado checo chegou a obrigar crianças ciganas a freqüentar centros para doentes mentais.
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Notícia da Rádio e Televisão de Portugal (RTP) sobre os ciganos
-Apenas aúdio-




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15/08/2010

Custo de oportunidade

Em economia o "Custo de Oportunidade" representa o custo associado a uma determinada escolha medido em termos da melhor oportunidade perdida. Explicando. Representa o valor que atribuímos à melhor alternativa entre outras possíveis - se escolho "a" ao invés de "b" é por considerar a primeira alternativa mais "vantajosa" que a segunda dentro de determinada situação. Mas, ao fazer tal escolha, perco aquilo que adviria caso tivesse escolhido a segunda alternativa.
Para além do seu sentido econômico e no sentido que aqui empregamos, o custo de oportunidade está diretamente relacionado com o fato das nossas escolhas estarem sempre entre alternativas possíveis. Ou melhor, sempre que escolhemos o fazemos por termos mais de uma alternativa, caso contrário não seria escolha, seria determinação ou algo parecido. Como somos levados a escolher o tempo todo, essas escolhas implicam em abrirmos mãos de determinadas oportunidades ou possibilidades em detrimento de outras, o que traz como conseqüência a existência de um custo de oportunidade sempre que tomamos uma decisão, sempre que escolhemos. Enfim, escolhas implicam em ganhos e perdas. Resta-nos avaliar se o que perdemos compensa o que ganhamos e vice e versa, se aquilo que ganhamos compensa o que perdemos.
Mais um ponto. O custo de oportunidade representa o valor associado à melhor alternativa não escolhida. O que significa? Significa que há de se levar em consideração também o fato de que a alternativa escolhida pode não trazer os benefícios que a alternativa não escolhida traria - quando escolho "a" posso estar deixando de lado benefícios que seriam mais vantajosos casa tivesse escolhido "b". O que temos é que o custo de oportunidade diz respeito também ao maior benefício que não foi obtido na escolha, ou seja, a escolha não trouxe o beneficio esperado e pior, a outra alternativa seria de fato a melhor.
Por que escolhemos algumas coisas e não outras? Por que atribuímos valor a isso e não aquilo? O que me leva a viver de uma maneira e não de outra? São questões que levam em consideração critérios de valor. Tais critérios que usamos para valorar algo estão relacionados de alguma maneira com o custa de oportunidade que vislumbramos ao escolhermos algo. O ponto central da questão se encontra exatamente nos critérios que usamos para escolher. Serão eles critérios que me possibilitarão a melhor escolha? E mais, o que seria uma boa escolha? Estamos realmente capacitados para avaliarmos entre alternativas possíveis? Será que estamos sobretudo prontos para avaliações críticas?
Alexsandro
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14/08/2010

Gente que enche o saco

Gente que lê livro de auto-ajuda e acha que está lendo filosofia.
Gente que acha que sabe do sentido da vida.
Gente que acha que escuta a melhor música do mundo.
Gente que acha que a regra vale mais que a vida.
Gente que vive em busca da "cara-metade".
Gente que acha que pagar é de fato ter direito.
Gente que acha que futebol é coisa de todo brasileiro.
Gente que acha que ser brasileiro é a melhor identidade do mundo.
Gente que acha que ter identidade é a melhor coisa do mundo.
Gente que coloca a aparência acima de tudo.
Gente que aparenta o que não sabe o que é.
Gente que despreza o que simplesmente não entende e por não entender acha que não deve possuir valor algum.
Gente que gera expectativas que não levam a nada.
Gente que ensina o que não entende e que ao invés de libertar o pensamento o torna algo difícil de funcionar.
Gente que espera por milagres.
Gente que venera a deuses mortos.
Gente que revela o pior do mundo em suas ações.

Alexsandro
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Qual o perigo que corremos diante de tanta mediocridade advinda do mundo artistico?

A vida humana é uma experiência que em grande parte dela estamos em busca de respostas para os mais diversos dilemas e problemas. É uma vida em busca de respostas para que ela própria possa ser experimentada da maneira mais plena possível, ou seja, buscamos respostas para tentar expandir a vida, renovando-a e fortalecendo-a cada instante.
A par deste fato devemos procura entender o perigo que corremos ao sermos seduzidos por obras de arte medíocres, qual seja, o de perdemos a dimensão criativa da arte em nossas próprias vidas, essa característica que a torna tão necessária para todos nós, sobretudo a uma vida que deseja a todo instante superar o momento, as forças que a constrange, as adversidade ambientes. Devemos entender que a arte, em suas diversas formas de expressão é o laboratório das experimentações para novas possibilidades de sermos outros e outras para além daquilo que se encontra determinado pela média do ambiente no qual circulamos.
Alexsandro
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26/07/2010

Pastores à beira de um ataque de nervos




Pode parecer que estamos tirando uma com a cara dos pastores evangélicos, mas o pior é que não estamos (pelo menos não dessa vez). A quem o assunto interessar é só fazer uma busca na net e verificar que o assunto é sério e verdadeiro, ou seja, muitos pastores estão surtando. Os motivos apontados são vários:
- descuido com a saúde mental;
- solidão;
- falta de acompanhamento para compartilhar seus problemas;
- ativismo ministerial;
- falta de repouso adequado;
- pressão institucional por resultados em termos de número de membros e ofertas.
Este último ponto acaba sendo o mais que mais provoca problemas. O motivo? O desencontro entre o chamado de Deus e a prática pastoral revelado no conflito interior de ser um homem de Deus, mas que vive sendo cobrado por uma organização (muitas com sentido empresarial) que os afeta com freqüentes cobranças por resultados contábeis: dízimos, ofertas, de batismos, etc. Um dia sonharam servindo a Deus e hoje se vêem como apenas mais um funcionários da OASD - Organização Arrecadadora do Sagrado Dízimo.
A coisa se complica quando os fieis confrontam seus pastores em busca de posturas mais condizentes com o cargo que ocupam, esses se vêem em conflito por serem constrangidos a agirem incoerentemente, ou melhor, de forma oposta aos princípios bíblicos e tendo certeza que os fieis notarão.
Não podemos informar com certeza até que ponto os números a seguir são coerentes, mas se forem a coisa se revela assustadora, sobretudo por saber que essas pessoas são vistas como referência em vários quesitos.
47% dos pastores evangélicos sofrem de transtornos mentais
16% têm depressão
13% Não conseguem dormir normalmente

O quadro que constatamos lendo algumas reportagens na net é o seguinte:
- pastores estressados, a ponto de explodir;
- pastores em tratamento psicológico e psiquiátrico;
- pastores com crises de depressão profunda;
- pastores tendo crises emocionais durante os sermões;
- pastores dependentes de remédios de tarja preta;
- pastores que apresentam tendências suicidas;
- pastores cujas famílias viraram a válvula de escape de seus problemas e se tornam vitimas dos seus ataques físicos e emocionais.


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13/07/2010

Um conto atemporal

Lançada como primeiro single do álbum Breakfast in America em 1979, "The Logical Song" (A canção lógica) é uma música da banda britânica Supertramp. Foi escrita e interpretada por Roger Hodgson.

A letra fala da perda da inocência. Critica o sistema educacional que não é centrado no conhecimento nem na sensibilidade, mas sobretudo na "lógica", no "bom senso" e na "coerência". A música fala de um homem que é retirado do ambiente encantado da infância e colocado na escola com o intuito de ser preparado para um futuro promissor, embora desprovido de qualquer espontaneidade. Enfim, um mundo que o preciona a ser um conformista. Perdido nesse mundo ela já não sabe quem é.





Quando eu era jovem,
Parecia que a vida era tão maravilhosa,
Um milagre,oh ela era tão bonita,mágica.
E todos os pássaros nas árvores,
Eles cantavam tão felizes,
Alegres,brincalhões,me olhando.
Mas aí eles me mandaram embora,
Para me ensinar a ser sensato,
Lógico,responsável,prático.
E mostraram um mundo
Onde eu poderia ser dependente,
Doente,intelectual,cínico.

Tem vezes,quando todo mundo dorme,
As questões correm profundas demais
Para um homem tão simples.
Por favor,me diga o que aprendemos
Eu sei que soa absurdo,
Mas por favor me diga quem eu sou.

Eu digo :
Agora cuidado com o que você diz,
Ou eles estarão te chamando de radical,
Liberal,fanático,criminoso
Você não vai assinar seu nome,
Gostaríamos de sentir que você é
Aceitável,respeitável,aprensentável,um vegetal !

À noite,quando todo mundo dorme,
As questões correm tão profundas
Para um homem tão simples.
Por favor,me diga o que aprendemos
Eu sei que soa absurdo,Mas por favor me diga quem eu sou.
Quem eu sou...


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09/07/2010

Só uma palavra me devora



A música Jura Secreta foi gravada primeiramente por Fagner.
Aqui numa versão nas vozes de Simone e Zélia Duncan.
A composição é de Sueli Costa e Abel Silva.

Só uma coisa me entristece
O beijo de amor que não roubei
A jura secreta que não fiz
A briga de amor que eu não causei

Nada do que posso me alucina
Tanto quanto o que não fiz
Nada do que eu quero me suprime
Do que por não saber ainda não quis

Só uma palavra me devora
Aquela que meu coração não diz
Só o que me cega, o que me faz infeliz
É o brilho do olhar que eu não sofrí


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07/07/2010

Três lições copernicanas

Nicolau Copérnico (1473-1543), astrônomo polonês,
conhecido pela teoria heliocêntrica que havia sido descrita
por Aristarco de Samos, segundo a qual o Sol se encontrava
no centro do Universo e a Terra girava em torno deste.


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Parece fácil afirmar hoje que o Sol está no centro do Sistema Solar e que os planetas giram à sua volta em órbitas elípticas. Como poderíamos pensar diferentemente, visto que este é o arranjo mais óbvio de nossa vizinhança cósmica? Na verdade a coisa não é bem assim. O que vemos é o Sol girar em torno da Terra e não o oposto. Afinal, não é o sol que nasce no leste e se põe no oeste? Fazer a Terra girar em torno do Sol é, no mínimo, contra-intuitivo. Não é à toa que apenas em 1543, com a publicação do livro de Nicolau Copérnico, onde ele descreve o Sistema Solar com o Sol no centro, é que começou – lentamente – a ficar claro que nem sempre o que vemos ou percebemos do mundo é o que corresponde à realidade. Estranha essa idéia de que o arranjo do cosmo pode ser tão distinto daquilo que o bom senso ditaria.

Esta é a primeira lição copernicana: os sentidos podem construir uma realidade falsa se não tiverem a razão ao seu lado.

Por que Copérnico resolveu desafiar dois milênios de sabedoria, baseada na filosofia de Aristóteles? A igreja havia já adotado a descrição aristotélica do cosmo, onde a Terra ocupava o centro, sendo circundada pela Lua, Sol, planetas e estrelas. A parte mais oportuna deste arranjo cósmico para a igreja era a separação que Aristóteles fazia entre o mundo sublunar, onde as mudanças e transformações materiais podiam ocorrer, e o resto do cosmo, onde tudo era eternamente igual. A decadência humana era então associada a mudanças materiais (e carnais) perto da Terra, enquanto a perfeição ficava longe, na morada de Deus. Pôr o sol no centro era destruir este arranjo, pois transformava a Terra em mais um planeta e não no centro de mudanças e transformações. E o Sol, sendo perfeito e eterno não podia pertencer à subesfera da decadência. Para pôr o Sol no centro, era necessário criar uma nova física, em que a Terra e os planetas obedecessem os mesmos princípios. Dois motivos levaram Copérnico a dar esse passo, ambos baseados em um impulso estético. O primeiro, que os movimentos celestes deveriam ser em órbitas circulares e com velocidades constantes. Essa idéia era quase que sagrada, um princípio criado por Platão, o mestre de Aristóteles. Por que o círculo? Pois ele, sendo a figura geométrica mais perfeita, onde todos os pontos são equivalentes, deveria, sem dúvida, ter sido a escolha do Demiurgo, a divindade grega que arquitetou o cosmo e suas estruturas. O segundo princípio estético usado por Copérnico era, claro, o arranjo dos planetas em torno do Sol. Conhecia-se já, na época, o período orbital dos planetas, o tempo que eles demoravam para dar uma volta completa em torno do Sol. Portanto, raciocinou Copérnico, basta arranjá-los em ordem crescente, de modo que Mercúrio, de período mais curto, fique mais perto do Sol e Saturno de período mais longo, fique mais longe (não se conheciam ainda os outros planetas Urano, Netuno e Plutão, invisíveis a olho nu). Com estes princípios estéticos, Copérnico criou um novo arranjo do Sistema Solar, desafiando o pensamento aristotélico, mesmo sem ter qualquer prova de que suas idéias estavam certas.

Esta é a segunda lição copernicana: a inspiração para a ciência muitas vezes é guiada por princípios estéticos.

Mas estética não garante precisão. Apenas através de uma confirmação direta, baseada em medidas e sua análise quantitativa, é que podemos julgar ou não a validade de uma hipótese sobre a natureza, por mais atraente ou elegante que ela seja. A estética é uma sedutora ambígua, fundamental e traiçoeira. Passaram-se mais de 50 anos até que as idéias copernicanas começaram a ser aceitas. Por que toda a demora? Será que os astrônomos da época eram incompetentes? A virada começou com Galileu e Kepler no início do século 17, ambos grandes defensores de Copérnico, por motivos diferentes. A razão foi a falta de confirmação observacional dessas idéias, aliada a um número relativamente pequeno de pessoas trabalhando em astronomia na época. Mais ainda, a posição da igreja e dos luteranos também não ajudava muito. Os seguidores de Copérnico tiveram um trabalho muito maior do o próprio, pois eles tiveram de testar as idéias e aprimorá-las, como foi o caso de Kepler com as órbitas elípticas, que seriam extremamente "feias" para Copérnico.

Esta é a terceira lição copernicana: em ciência, como em qualquer outra atividade criativa, ninguém pode trabalhar sozinho. O conhecimento é como uma corrente em que cada idéia é um elo, uns mais fracos, outros mais fortes, forjados todos pela nossa curiosidade.

Marcelo Gleiser


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04/07/2010

Das sombras as sombras

O amor de Orfeu e Eurídice: do sofrimento como motivação para ajudar

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Orfeu apaixonou-se por Eurídice e casou-se com ela. Mas Eurídice era tão bonita que pouco tempo depois do casamento atraiu um apicultor chamado Aristeu. Quando ela recusou suas atenções ele a perseguiu. Tentando escapar ela tropeçou em uma serpente que a picou e a matou. Por causa disso as ninfas, companheiras de Eurídice, fizeram todas as suas abelhas morrerem.
Orfeu ficou transtornado de tristeza. Levando sua lira foi até o Mundo dos Mortos para tentar trazê-la de volta. A canção pungente e emocionada de sua lira convenceu o barqueiro Caronte a levá-lo vivo pelo rio Estige. A canção da lira adormeceu Cérbero, o cão de três cabeças que vigiava os portões. Seu tom carinhoso aliviou os tormentos dos condenados. Encontrou muitos monstros durante sua jornada e os encantou com seu canto. Finalmente Orfeu chegou ao trono de Hades. O rei dos mortos ficou irritado ao ver que um vivo tinha entrado em seu domínio, mas a agonia na música de Orfeu o comoveu e ele chorou lágrimas de ferro. Sua esposa, a deusa Perséfone, implorou-lhe que atendesse o pedido de Orfeu. Assim, Hades atendeu seu desejo. Eurídice poderia voltar com Orfeu ao mundo dos vivos. Mas com uma única condição: que ele não olhasse para ela até que ela, outra vez, estivesse à luz do sol. Orfeu partiu pela trilha íngreme que levava para fora do escuro reino da morte, tocando músicas de alegria e celebração enquanto caminhava para guiar a sombra de Eurídice de volta à vida. Ele não olhou nenhuma vez para trás até atingir a luz do sol. Mas então se virou, para se certificar de que Eurídice o estava seguindo. Por um momento ele a viu perto da saída do túnel escuro, perto da vida outra vez. Mas enquanto ele olhava, ela se tornou de novo um fino fantasma (ou em outras versões uma estátua de sal), seu grito final de amor e pena, não mais do que um suspiro na brisa que saía do Mundo dos Mortos. Ele a havia perdido para sempre. Em desespero total Orfeu se tornou amargo. Recusava-se a olhar para qualquer outra mulher, não querendo lembrar-se da perda de sua amada.
Posteriormente deu origem ao Orfismo, uma espécie de serviço de aconselhamento; ele ajudava muito os outros com seus conselhos , mas não conseguia resolver seus próprios problemas, até que um dia, furiosas por terem sido desprezadas, um grupo de mulheres selvagens chamadas Mênades caíram sobre ele, frenéticas, atirando dardos. Os dardos de nada valiam contra a música do lirista, mas elas, abafando sua música com gritos, conseguiram atingi-lo e o mataram. Depois despedaçaram seu corpo e jogaram sua cabeça cortada no rio Hebro, e ela flutuou, ainda cantando, "Eurídice! Eurídice!" Chorando, as nove musas reuniram seus pedaços e os enterraram no monte Olimpo. Dizem que desde então os rouxinóis das proximidades cantaram mais docemente que os outros. Pois Orfeu, na morte, se uniu à sua amada Eurídice.

Algumas interpretações deste mito dizem que as pessoas que se dedicam a ajudar os outros são pessoas que reconhecem que sofrem ou sofreram algum problema grave e agora buscam evitar que os outros sofram o que eles sofreram, ou seja, é aquele que cura, mas que não consegue se auto curar. Dizem ainda que no fundo essas pessoas estão se auto enganando, pois evitar que os outros sofram não vai apagar o que eles mesmos sofreram.


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