10/03/2014

PARAÍSO E PERFEIÇÃO

O que é perfeito não muda; ou só muda se for para deixar de ser perfeito.
Logo, se existe um paraíso e for perfeito, ele é imutável.*
Aquilo que é imutável, consequentemente, se torna monótono e para a experiência humana** a monotonia poder se tornar uma experiência terrível. 
Logo, se é monótono e é eterno, temos uma monotonia eterna.
E a experiência de uma monotonia eterna para nós humanos é uma contradição se a entendemos como um paraíso, sobretudo pelo fato desta monotonia poder se tornar uma experiência terrível. 
A questão é: como podemos experimentar o paraíso sem que ele se torne uma experiência terrível, o que tiraria dele a definição de paraíso e lhe impingiria a definição de inferno? Talvez a resposta seja não perceber a monotonia. ¿Mas como não perceber a monotonia do paraíso, sua imutabilidade eterna? Pode ser sugerido três possibilidades:
Primeiro: - Existir, perceber a si, mas não perceber o paraíso (existo, estou no paraíso, mas não me percebo estando nele – alienação completa do lugar ou estado de experiência);
Segundo: - Existir, perceber o paraíso, mas não perceber a si; (existo, estou no paraíso, mas não percebo a mim – alienação completa de si mesmo);
Terceiro: - Existir, mas não perceber a si nem o paraíso.

Duas perguntas que valem para as três propostas:
¿Como essas experiências seriam possíveis?
¿Qual o valor de experimentar o paraíso na condição de uma destas possibilidades?


¿Tendo tudo isso em consideração é plausível afirmar que uma experiência de paraíso só nos é possível numa não experiência do paraíso, enfim, se não existirmos? ¿O paraíso é para nós a não existência dele e nossa?


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* ¿Se não for perfeito pode ser considerado paraíso?

** Pode ser questionada a noção de “experiência humana”, no sentido de se afirmar que o paraíso não seria experimentado a partir da perspectiva ou percepção meramente humana (com tudo que isso possa significar). Aqui caímos no ponto "Segundo" sobre como é possível experimentar o paraíso, que indica que existo, mas já não me percebo como tal ou como antes [Existir, perceber o paraíso, mas não perceber a si; (existo, estou no paraíso, mas não percebo a mim – alienação completa de si mesmo)].

05/03/2014

Relações face a face e relações “on line”

O conceito básico de socialização implica no processo que, entre outras coisas, é ensinado a alguém como se comportar dentro da sociedade. Diz respeito ao processo pelo qual alguém ensina a alguém como se relacionar com os outros. Pode parecer estranho para muitos, mas ninguém nasce sabendo o que fazer com a própria vida e como proceder diante dos outros que povoam suas relações e com os quais se compartilhará a vida, isso precisa ser aprendido. Por isso todos nós tivemos mentores que nos disseram como lidar com a vida e com os outros (se foram bons ou maus mentores é outra história). Desta forma o acesso a sociedade e ao convívio com os outros teve e tem um custo, além de ser um processo longo e trabalhoso, houve e há sobre cada um de nós um investimento emocional e material significativo cujo saldo final é o esforço que temos de fazer para viver em grupo e tornar o estar junto uma experiência boa. 
A questão é: com o advento das relações “on line” como fica tal esforço?
Toda vida em sociedade foi mantida e ainda é baseada nas relações face a face. Este tipo de relação é determinada por papeis sociais que são anteriores aos sujeitos. Elas, as relações face a face, até certo ponto (e um ponto bem profundo), esperam de todos os envolvidos um compromisso significativo e significante, tornando a todos coadjuvantes de sua dinâmica. Elas dão e elas cobram. Dela os sujeitos fazem parte de maneira compulsória. Nas relações face a face desfazer laços é extremamente complicado, doloroso e arriscado. As relações face a face são eventos difíceis: manter uma postura, assumir posições, expressar sentimentos, encarar os outros, nem sempre é fácil ou segue no rumo das nossas expectativas.
A ideia de que a vida baseada na relação face a face deve ser adorável o tempo todo não tem como se sustentar. 
Nas relações “on line”, por outro lado, existe a possibilidade de escolher até onde vai a participação e o envolvimento. Conectar e desconectar são a lógica dinâmica deste tipo de relação. Pela facilidade de conectar e desconectar, e sendo este o seu maior atrativo, o poder de manejar a possibilidade de desconectar-se sempre que algo não está do agrado faz dela uma relação com pouco ou sem nenhum compromisso. Se é fácil fazer contatos, adicionar amigos, mais fácil ainda é desfazer-se deles.
Na relação “on line” o compromisso é tão fluido e a exigência de compromisso é tão insignificante que a tecla “Delete” funciona como uma varinha mágica nos momentos que é se é envolvido pelos sentimentos de nojo, enfado ou aborrecimento com alguém ou com algo. Desta maneira tais relações se mantêm não apenas porque colocam as relações no limite da superficialidade, mas também porque delas é mais fácil escapar. 
O pressuposto da relação “on line” é ideia de que a vida deve ser adorável o tempo todo. 


Alexsandro