28/04/2014

Simples, muitos simples

Somos apenas operários na fábrica. E o patrão não liga se morremos ou vivemos, pois há muitos outros para trabalhar para ele.

19/04/2014

O doce sabor do não entender





Vamos fazer um exercício de pensamento... A presença de deuses na história humana deriva de vários fatores, mas dois dos elementos principais para criação de deuses foram e são o medo e a necessidade de sentido para vida (viver para o nada parece estranho), mesmo que este sentido contenha alguma forma de dominação, ou seja, me submeto a algo, mas ganho um sentido para viver. Vamos pensar, por exemplo, o deus judaico-cristão. Quando analisamos seus atributos - Onipotência, Onipresença e Onisciência - percebemos que eles amarram os principais elementos da vida humana, ou seja, eles dão respostas e suportes para o medo e o sentido para vida pois trabalham com uma fórmula perfeito, qual seja, consegue unir poder e saber em uma só criatura – o poder para resolver o problema da morte e o saber que conteria as respostas para o sentido da vida.
Por sua vez pensar a Humanidade através da Evolução deixa para nós o problema de resolver o medo e o sentido da vida.
Nós somos natureza, a natureza se encontra em nós. Fazemos parte dela e ela de todos nós. Assim se move em nós o desejo de nunca se desligar dela. Queremos com ela estar conectados o tempo todo. Só que isso exige muito empenho de todos nós, exige uma potencia de criação tremenda, demanda todo nosso tempo. Viver passa a significar estar vivo e ter de inventar tudo para que a vida ganhe significado, sabendo que qualquer que seja o significado ele será artificial, ficcional e sem justificativa transcendental, sobrando apenas o desejo de querer permanecer na natureza e realizar-se nela e por ela em um exercício de potenciação de si e empoderamento de si constante. Logo, pensar a Humanidade através da Evolução tem muito mais heroísmo humano do que pensá-la por via da Criação. Talvez até mesmo seja por isso que não se deseja que as pessoas conheçam essa história. Pois é bem possível que quanto mais as pessoas tiverem conhecimento de quanto somos capazes de feitos incríveis, talvez mais elas desejem se libertar de seus opressores. (Aqui entra em questão a relação opressor X oprimido que não é uma relação fácil de ser entendida - qualquer um pode fazer parte tanto de um grupo quanto do outro, sem contar o fato de que a opressão pode ser desejada -e sempre é - e se encontrar camuflada nos discursos que, em aparência, são libertadores.)
Para aqueles que foram, que estão e que serão oprimidos (e todos nós corremos o risco) vale ter em mente como é o doce sabor da estupidez do não entender, como bem disse Clarice Lispector:

E era bom. 'Não entender' era tão vasto que ultrapassava qualquer entender - entender era sempre limitado. Mas não entender não tinha fronteiras e levara ao infinito, ao Deus. Não era um não entender como um simples de espírito. O bom era ter uma inteligência e não entender. Era uma bênção estranha como a de ter loucura sem ser doida. Era um desinteresse manso em relação às coisas ditas do intelecto, uma doçura de estupidez.
Alexsandro


14/04/2014

Simples assim (2)

Procure argumentos para justificar seu ponto de vista.

Dizer simplesmente que acredita e pronto não justifica nada.

Colocar as próprias crenças acima de tudo e de todos é sinal pretensão. Assim como exigir que os outros não critiquem as nossas crenças não é o mesmo que exigir respeito, é apenas o desejo de fazer os outros aceitarem sem questionar.

Se sua forma de pensar pode ser refutada é um erro continuar pensando da mesma forma ou, mais do que isso, pode ser burrice.

A sua integridade deve ser maior que sua frustração, ou seja, se seu pensamento foi refutado de nada vale desejar fazer com que ele faça sentido à força.

As evidências são fundamentais para pensar a respeito de algo.


Alexsandro

Simples assim

Cada pessoa pensa como pode e interpreta como merece.


Alexsandro

13/04/2014

O abuso e o excesso de obediência

Nossas interpretações e críticas são sempre construídas a partir de quem manda. É desta forma, por exemplo, que se fala muito contra o Estado e sua forma de governo sobre nós, contra os diversos tipos de lideres que se encontra em empresas, igrejas, escolas, etc.. As criticas são sempre construídas tendo como referência principal quem manda. ¿E se invertêssemos a lógica e afirmássemos que o problema não é abuso ou excesso de poder, mas o abuso e o excesso de obediência? ¿Será que parte dos nossos problemas em ajustar melhor a vida em sociedade não se encontra na nossa excessiva obediência a qualquer forma externa de governo sobre nós?

¿A desresponsabilização de si diante da vida fica mais fácil quando temos a quem culpar por nossos infortúnios?¿ Parte da nossa aceitação em se deixar governar e, como consequência, nossa excessiva obediência, adviria do pensamento de que a obediência a outro tira de quem obedece as responsabilidades? A ideia é bem simples: obedecer para ter a quem culpar quando algo sair errado, desta forma a culpa será de quem deu a ordem e não de quem obedeceu. ¿Essa não seria uma forma covarde de viver?


Alexsandro

11/04/2014

O conceito de “outro”

¿Quem ou o que é o “outro”? A resposta adequada a esta pergunta tem como condição saber de antemão quem pergunta ou a quem se vai responder. O motivo é que o “outro” é múltiplo. O que denota que o “eu” que pergunta também é múltiplo.
Para o “eu” o “outro” pode se apresentar sob a pele de inúmeros modos de ser. Logo, toda vez que um “eu” define um “outro” o próprio “eu” é (re)definido. Vejamos alguns exemplos de como para o “eu” o “outro” pode se apresentar de diversas formas:
            - Na forma animal – sendo o outro um Primata;
            - Na forma cibernética – sendo o outro um ciborgue;
            - Na forma etária – sendo o outro um velho, uma criança;
            - Na forma étnica – sendo o outro um índio, um aborígene, um galego;
            - Na forma estratificada – sendo o outro um miserável, um desocupado, um andarilho;
            - Na forma estética – sendo o outro um alto, gordo, esquelético, baixo, albino;
            - Na forma sexual – sendo o outro um homossexual, assexuado, transexual;
            - Na forma política – sendo o outro um estrangeiro, um refugiado, um expatriado.


Em termos teóricos, partimos do conceito de territorialização definido por Guattari e Deleuze, que, entre outros aspectos, entende a noção de território como produto de um processo de subjetivação, fruto de “dobras”, dos agenciamentos dos fluxos, dos movimentos de imagem, de som, de palavras, de matérias, de sentimentos que caíram nas malhas de um poder. Neste sentido, podemos entender a noção de “eu” e de “outro” como um agenciamento, como um dispositivo de poder.
Tanto é que percebemos o “eu” e o “outro” como categorias fixas, estabelecidas em seus devidos territórios desde sempre lá, estabelecidas claramente em suas fronteiras cristalizadas, endurecidas. Nunca vemos o “eu” e o “outro” como possibilidades em movimento, nunca definidos e indefiníveis.
O conceito de “eu” e de “outro” estabelecem um dentro e um fora. E por entre suas fronteiras circulam potências e sentidos. Por conta disto, ao tratar de fronteira entre o “eu” e o “outro”, tentamos percebê-la como um espaço de negociação, de lutas, como uma ‘linha’ sempre em construção, como um espaço de circulação de alteridades e de afetos’
O “outro” e o “eu” são multiplicados pelos entreolhares de um sobre o outro. Se o “eu” por si já é um múltiplo de si e o “outro” também é um múltiplo de si, de um lado a outro múltiplas serão as formas pelas quais serão afetados, pelas quais um afetará o outro. Tanto é que no contato do “eu” com o “outro”, sentidos se perdem, deixa de ser, somem, e no reverso, sentidos vêm, se acham, passam a ser, aparecem. No entrelaçar da alteridade os antigos ambientes afetivos se tornam ultrapassados para expressão de novos afetos - movimentos de transformações que se fazem pela e na destruição e no evaporar de certos mundos, de certas configurações culturais, de certas relações sociais, de certos sentidos e de certas fronteiras.

Só um cartógrafo dos afetos para traçar as linhas desta fronteira que o contato do “eu” com o “outro” delineia e que o movimento dos fluxos de alteridade fazem nascer. 




Alexsandro

08/04/2014

As Folhas Tristes


É bem sabido que o dinheiro é um dos temas centrais da economia. Assim como o fato de que a quantidade de dinheiro numa dada economia implica diretamente numa série imensa de fenômenos. Mas não sei se algum economista foi tão claro e sensível a ponto de defini-lo como fez o povo Kayapó.

"Piu Katin" é como o povo Kayapó chama o dinheiro. E significa "Folha Triste". Confesso que foi a definição mais angustiante que já tomei contato quando se trata do tema dinheiro, tamanha sua delicadeza ao definir aquilo que no mundo capitalista (que é o nosso) é percebido por nós como o centro da nossa experiência, afinal, trocamos a vida por dinheiro, ou, segundo os Kayapós, por folhas tristes.


Alexsandro

06/04/2014

Autoestima X estima recíproca

Autoestima é fruto de um discurso individualista de mercado que parte da ideia de autossuficiência. A autoestima se assenta sobre o cascalho da noção moderna de “Eu” para construir seu pavimento. Um “Eu” determinado (pelo mercado) e determinante (agindo sobre o si mesmo), sem abertura e fechado para alteridade, orgulhoso filho da ignorância do outro. Autoestima é produto, é mercadoria, por isso se fala tanto nela, porque autoestima vende, dá lucro e nos mantém aliados do status quo.
Quase ninguém fala de estima recíproca, esta antítese da autoestima.
Estima recíproca – estimar o outro e ser estimado por ele. Constituí-lo e ser constituído por ele. Habitá-lo e ser habitado por ele. Com ele criar laços, inventar formas de relação, compreender os gestos dos afetos (à moda de Espinosa). Reconhecer que precisamos do outro e que com ele compartilhamos a vida. Estimar e ser estimado pelo outro, lembrando sempre que a autoestima não é suficiente para suportar a vida.


Alexsandro

Dá muito trabalho ser feliz


É muito esforço, pelo que percebo ser feliz dá muito trabalho, sai caro e exige muito empenho e dedicação. Entre tantas outras coisas, tem que ter dinheiro, tem que morar numa bela casa, tem que ter um animal de estimação e levá-lo no pet shop toda semana, comprar ração, sair para passear, ver o bicho defecar e fazer xixi.
Depois tem que ter carro, mas não basta ter carro, tem de trocar de carro todo ano (e o trabalho que dá lidar com toda documentação do carro novo).
Também não basta ser saudável, tem que ficar magro, gostoso, atleta olímpico de ponta. Precisa frequentar uma academia. Ir ao cabeleireiro toda semana, fazer as unhas, limpeza de pele. Sem contar as idas às clinicas de estéticas e todos aqueles tratamentos contra celulite, gordura localizada. Aparelho nos dentes é fundamental para ser feliz. Um silicone aqui e ali também não pode faltar. Um guarda roupa completíssimo, afinal ninguém é feliz repetindo roupas.
Tem que entrar numa faculdade (e não vale qualquer faculdade).Tem que ser bom nos estudos, afinal ninguém poder ser feliz se for considerado o idiota da sala ou se não tiver coisas inteligentes para falar.
Na vida profissional tem que fazer sucesso, não basta estar empregado, tem conseguir um bom emprego. Tem que ser o tal: ter cartão de visita, ir a jantares em restaurantes chiques e hotéis cinco estrelas.
Tem que estabelecer metas e depois tem de realizá-las (processo que exige empenho todos os dias). Tem que se focar nas emoções positivas, nos momentos bons (não sei o que se faz com os momentos ruins quando se vive para ser feliz). Tem que ler livros de autoajuda para aprender a focar naquilo que traz bem-estar e satisfação. Sem falar de todo esforço para conseguir o tal autoconhecimento.
Tem de aprender a tocar um instrumento (afinal ninguém é feliz se não puder animar uma festa, ser o centro das atenções).
É preciso ser assinante de TV por assinatura e ter Internet rápida. Tem que ter um celular de última geração e com ele estar conectado o dia todo: Facebook, Blog, e-mail, WhatsApp, Twitter, etc.
Tem que ter atrativos para atrair outras pessoas para sua casa, principalmente os amiguinhos dos seus filhos: vídeo games, brinquedos “ultramegapowers”, uma geladeira repleta de coisas gostosas, estar disposto para passear no shopping sempre que possível. (De qualquer forma ir ao shopping é fundamental para ser feliz).
Tem que viajar, principalmente para lugares que seus amigos desejam conhecer, pois, desta forma, você faz duas coisas que também são fundamentais para ser feliz, conhecer um lugar novo todo ano e fazer inveja aos infelizes que não podem viajar.
Na vida amorosa... nem vou tocar nesse assunto, basta dizer o quanto me assusta ter de pensar em declarações de amor eterno e  jantares a luz de vela, lingerie nova e depilação sempre em dia. Fazer coraçãozinho com as mãos é demais para mim.
Acho que prefiro ser infeliz, é mais fácil, mais simples, não custa quase nada e eu posso ser eu mesmo (seja lá o que isso signifique, afinal não preciso me preocupar em ser esse tal de “eu mesmo” para ser infeliz). É, ser infeliz dá muito menos trabalho.
P.S.: ¿Como não percebi isso antes? Tudo teria sido bem mais fácil.



Alexsandro