11/04/2014

O conceito de “outro”

¿Quem ou o que é o “outro”? A resposta adequada a esta pergunta tem como condição saber de antemão quem pergunta ou a quem se vai responder. O motivo é que o “outro” é múltiplo. O que denota que o “eu” que pergunta também é múltiplo.
Para o “eu” o “outro” pode se apresentar sob a pele de inúmeros modos de ser. Logo, toda vez que um “eu” define um “outro” o próprio “eu” é (re)definido. Vejamos alguns exemplos de como para o “eu” o “outro” pode se apresentar de diversas formas:
            - Na forma animal – sendo o outro um Primata;
            - Na forma cibernética – sendo o outro um ciborgue;
            - Na forma etária – sendo o outro um velho, uma criança;
            - Na forma étnica – sendo o outro um índio, um aborígene, um galego;
            - Na forma estratificada – sendo o outro um miserável, um desocupado, um andarilho;
            - Na forma estética – sendo o outro um alto, gordo, esquelético, baixo, albino;
            - Na forma sexual – sendo o outro um homossexual, assexuado, transexual;
            - Na forma política – sendo o outro um estrangeiro, um refugiado, um expatriado.


Em termos teóricos, partimos do conceito de territorialização definido por Guattari e Deleuze, que, entre outros aspectos, entende a noção de território como produto de um processo de subjetivação, fruto de “dobras”, dos agenciamentos dos fluxos, dos movimentos de imagem, de som, de palavras, de matérias, de sentimentos que caíram nas malhas de um poder. Neste sentido, podemos entender a noção de “eu” e de “outro” como um agenciamento, como um dispositivo de poder.
Tanto é que percebemos o “eu” e o “outro” como categorias fixas, estabelecidas em seus devidos territórios desde sempre lá, estabelecidas claramente em suas fronteiras cristalizadas, endurecidas. Nunca vemos o “eu” e o “outro” como possibilidades em movimento, nunca definidos e indefiníveis.
O conceito de “eu” e de “outro” estabelecem um dentro e um fora. E por entre suas fronteiras circulam potências e sentidos. Por conta disto, ao tratar de fronteira entre o “eu” e o “outro”, tentamos percebê-la como um espaço de negociação, de lutas, como uma ‘linha’ sempre em construção, como um espaço de circulação de alteridades e de afetos’
O “outro” e o “eu” são multiplicados pelos entreolhares de um sobre o outro. Se o “eu” por si já é um múltiplo de si e o “outro” também é um múltiplo de si, de um lado a outro múltiplas serão as formas pelas quais serão afetados, pelas quais um afetará o outro. Tanto é que no contato do “eu” com o “outro”, sentidos se perdem, deixa de ser, somem, e no reverso, sentidos vêm, se acham, passam a ser, aparecem. No entrelaçar da alteridade os antigos ambientes afetivos se tornam ultrapassados para expressão de novos afetos - movimentos de transformações que se fazem pela e na destruição e no evaporar de certos mundos, de certas configurações culturais, de certas relações sociais, de certos sentidos e de certas fronteiras.

Só um cartógrafo dos afetos para traçar as linhas desta fronteira que o contato do “eu” com o “outro” delineia e que o movimento dos fluxos de alteridade fazem nascer. 




Alexsandro