02/09/2012

São eles que morrem, e não eu


O jornalismo de consumo faz do sensacionalismo seu modo de expressão. Dele nada escapa. Nada deixa de parecer “sensacional”: do bonito ao horrível, do legal ao ilegal, da merda do cachorro ao bolo de aniversário da vovó. Faz da banalidade um artigo metafísico. Faz da vergonha alheia o escândalo da moral. Ética é apenas uma abstração onírica. Priorizando o consumo, não a informação, mergulha numa sanha de atenção que não poupa nada, nem ninguém. Seu efeito no cotidiano é sentido na transformação do trágico em refresco de groselha: vemos o trágico, mas ele não nos afeta, não o sentimos, não pensamos sobre ele.

A presença no sensacionalismo, do horrível, do ilícito, do destino e da morte na vida quotidiana, é atenuada pelo modo de consumo jornalístico; o sensacionalismo é consumado, não segundo o rito cerimonial da tragédia, mas à mesa, no metrô, com café com leite. Os mortos das notícias sensacionalistas ainda que bem reais, enquanto os mortos de teatro são simulados, estão afinal mais longe do leitor do que os mortos shakespearianos o estão do espectador. As vítimas do sensacionalismo como da tragédia são projetivas, isto é, são ofertadas em sacrifício à infelicidade e à morte. A catarse é como que digerida no quotidiano, isto quer dizer que o grande tema de sacrifício “eles morrem em meu lugar”, se atenua num “são eles que morrem, e não eu". (Edgar Morin)


Alexsandro