No mundo da autoajuda, da motivação e da teologia da
prosperidade o apelo a ideia de "realizar” é uma constante. Vemos uma
infinidade de sugestões e dicas de como fazê-lo:
- O caminho para a realização de seus sonhos
pode não ser nada fácil. Muitas vezes, significa sacrifícios difíceis e
decisões cheias de riscos e inseguranças envolvidos. Para muitos é a coisa mais
difícil da vida. Ainda assim, podemos ver diariamente exemplos de pessoas que
não deixaram esses fatores serem maiores do que a vontade de conseguir o que
desejam;
Não sei se agindo assim estamos realizando algo. Tenha a
impressão que parece mais conformação que realização. Isso porque conformar é
desejar aquilo que está sendo oferecido e colocar aquilo como prioridade. É por
isso que muito daquilo que é apresentado como realização não passa de uma busca
por conformação. A ação que parte de uma forma preestabelecida e conveniente. É
colocar a ação em uma fôrma. Agir em direção ao estabelecido. Quando ouvimos
frases do tipo: “estou realizando um sonho”; o sentido pode ser traduzido
assim: “estou conformando minha vida ao que foi estabelecido como desejável.
Desejei o desejável e agora fui recompensado”.
Por sua vez podemos pensar a realização, o realizar, como uma
ação que tenta se esquivar do desejável, que tenta ir além do estabelecido.
A palavra realizar vem do latim reallis acrescida do sufixo izare (implementar, colocar em prática).
Podemos entender Realizar como a ação de criar algo para
além do campo da realidade.
Vamos por parte e iniciemos fazendo uma distinção entre “real”
e e “realidade”. O “real” pode ser entendido como tudo que existe; tudo,
independentemente de termos contato ou não, de sabermos de sua existência ou não.
Tudo que faz parte da nossa “realidade” faz parte do “real”, mas muito daquilo
que faz parte do “real” não faz parte da nossa “realidade”. Nossa “realidade” é
apenas um fragmento do “real”. Quando desejamos algo o fazemos dentro da nossa “realidade”
conhecida, para além dela não conseguimos pensar. Podemos intuir que existe
algo maior, mas dificilmente conseguimos conceber o que seja. Além desse fato
advém também que nunca nos relacionamos com o mundo em si, mais sempre
interpretamos o mundo. Nossa “realidade” é, por definição, o mundo segundo
nossa interpretação. Uma interpretação que é sempre construída por conjuntos de
valores e significados que constituem nossa cosmovisão.
Nós podemos inserir coisas no “real”? Sim, quando criamos.
Um poema não era real até o poeta escrevê-lo. Um personagem de uma ficção não
existia até ser descrito por um autor. No ato de criação podemos “realizar”,
por algo na “realidade”, e, por consequência, no “real”.
Assim, realizar pode ser entendida como a ação de por algo
diferente no mundo, de criar. Criação como uma experiência singular. Realizar
é, neste sentido, uma experiência artística. Um mergulho no caos, emergindo com
um sentido novo, uma expressão nova, um modo novo de fazer. É olhar em volta e
sentir que aquilo que o status quo
oferece não é suficiente, que há mais para além dele. É sentir o instinto de
criação pulsando forte.
Só há realização quando há criação. Na conformação não há
criação, no máximo reprodução. Só nos realizamos quando criamos.
Alexsandro
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